A pandemia da Covid-19 tem causado inúmeros estragos ao redor do mundo, inclusive recrudescendo muitas das mazelas sociais. E no cenário educacional isso se verificou de forma alarmante. Em agosto de 2020 a ONU mostrou que cerca de 100 países ainda não haviam anunciado data para a reabertura das escolas. No Brasil isso não foi diferente. O livro “A educação de meninas negras em tempos de pandemia: o aprofundamento das desigualdades” traz esse triste panorama de nosso país.

De acordo com o relatório da ONU “Educação durante e depois da Covid-19” (Education during COVID-19 and beyond), publicado em agosto de 2020, naquele momento, cerca de 100 países ainda não haviam anunciado uma data para a reabertura das escolas. O secretário Geral do organismo, António Guterres, ressaltava, na época, que mesmo antes da pandemia o mundo já sofria uma crise educacional, pois havia mais de 250 milhões de crianças em idade escolar sem frequentar a escola. Nos países em desenvolvimento, apenas um quarto dos estudantes do Ensino Médio concluiu o período com as habilidades básicas.

Representativo da realidade brasileira

Com o surgimento da Covid-19, conforme o secretário geral da ONU, pelo menos 40 milhões de crianças em todo o mundo perderam tempo de ensino no primeiro ano da educação infantil; e as famílias, especialmente as mães, foram forçadas a suportar a pesada carga de cuidados em casa. Na opinião de Guterres, apesar dos esforços para ofertar aulas não presenciais, assim como o empenho de docentes, mães e pais, naquele período ainda existia uma grande quantidade de crianças e adolescentes em idade escolar não alcançada.

O livro “A educação de meninas negras em tempos de pandemia: o aprofundamento das desigualdades”, é resultado de uma pesquisa realizada pelo Geledés Instituto da Mulher Negra, que apresenta um panorama da situação brasileira, através de uma amostragem que contemplou 105 famílias das cinco regiões da cidade de São Paulo (a maior do país), a maioria situada em bairros periféricos.

Os dados contidos na publicação mostram, entre outras questões (através de tabelas e discussões), as desigualdades de acesso aos instrumentos de aprendizagem, a falta de condições para o cumprimento das medidas sanitárias, as dificuldades de execução das atividades escolares (inclusive ressaltando fatores como insegurança alimentar e nutricional e suporte no desenvolvimento da rotina acadêmica).

Além de conter números referentes à pesquisa realizada com familiares das crianças e adolescentes, o livro traz informações oriundas das/dos docentes, que também foram ouvidas/ouvidos. Do conjunto de docentes perguntado acerca das consequências da pandemia no corpo discente, 73,83% responderam que as meninas negras são bem mais afetadas, pois são sobrecarregadas com tarefas domésticas, com baixa autoestima, com discriminação e racismo, entre outros fatores.

Ademais dos dados oriundos de pesquisa própria, o livro apresenta indicadores de variados organismos, como IBGE, Ipea, Fiocruz, Todos pela Educação, Fundação Abrinq, entre outros. Está formado por 123 páginas e contém 81 tabelas explicativas, as quais ajudam a desenhar o panorama educacional brasileiro em tempos de pandemia, a partir de um recorte de raça e gênero que infelizmente confirma o fato de que as opressões vividas pela população negra “recebem pouca atenção de órgãos e instituições de garantia e/ou defesa de direitos”, conforme ressaltam Jaqueline Santos e Sueli Carneiro, que assinam o livro.

Trata-se de uma leitura dura, mas necessária, pois as informações e análises ali contidas, apesar de retratar a cidade de São Paulo, são representativas da realidade brasileira como um todo; e servem como parâmetros para avaliarmos o quanto a pandemia da Covid-19 afetou ainda mais a situação precária da educação das crianças e adolescentes das periferias do nosso país, em especial a das meninas negras.

O livro, que é de fácil leitura, foi publicado este ano de 2021 e se encontra disponível, gratuitamente, através do site do Geledés Instituto da Mulher Negra, uma organização da sociedade civil que se posiciona em defesa de mulheres e negros, assim como também contra as demais formas de discriminação: https://www.geledes.org.br/a-educacao-de-meninas-negras-em-tempos-de-pandemia-o-aprofundamento-das-desigualdades-o-livro/.