CONTO

Por C. Alfredos Soares

 

 

Meu sonho de menino era ser jogador de futebol. 

Levava aquilo tão a sério que disputava torneios infantis e, depois, infanto-juvenis na minha cidade. 

Tudo começou no campinho de terra batida que tinha na minha rua. Ali jogava com meus eternos amigos Serginho, Marcelo, Eduardo, Antônio Luis, Anderson, Emersom, Renato, Wesli, Cláudio, Luís Carlos e as vezes alguns adultos, como meu tio Zé Carlos, Beto, Celso, Luis e Weslei. 

As peladas na rua eram levadas a sério, a ponto da gente  sair contundido após os rachas. Fui crescendo acreditando que levava jeito pra coisa. 

Incentivado pelo meu pai Tião Zé e por tio Hélio fui treinar no infantil do Barra Futebol Clube, papai era amigo do técnico. Me  lembro o dia que fui conversar com o Calebe, técnico da categoria, um negro de voz grave e quase dois metros de altura. Tremi dos pés a cabeça. Calebe era um doce de pessoa, sabia lidar com os meninos. Fui para o treino escalado lateral direita. Queria jogar no meio, como cabeça de área, mas ali jogava o craque do time de nome Marcinho. Dava gosto de vê-lo jogar. Do jeito que a bola vinha ele dominava e saia jogando. Percebi naquele momento que eu não jogava tanto quanto imaginava. Mas mesmo assim insisti. Jogar no meu time de coração exigiria sacrifício. 

O Flamengo de Zagalo – meu sonho oculto – estava lançando Zico, num time que tinha Toninho na direita e Rodrigues Neto na esquerda. Dois jogadores de seleção. Ainda tinha Manguito na zaga, Cantarelli no gol,  o argentino Doval no ataque e Júlio Cezar, o Iuri Gueller, pela esquerda. 

Cheguei ao Barra com 14 anos e sai com 17. Disputei vários campeonatos, até chegar a conclusão que o melhor a fazer era estudar. A bola ficou para trás sem nenhum tipo de ressentimento. Tinha que passar por aquilo pra ter certeza do que iria fazer no futuro. Do futebol ficou o amor pelas transmissões esportivas e, eu, fui fazer jornalismo. 

Em 90 fiz a cobertura da seleção do Lazaroni na estreia da concentração da Granja Comary, foram dias memoráveis ali vendo o time treinar. 

O futebol ficou pra trás quando percebi que os joelhos doíam após as partidas. Virei torcedor do radio de pilha e achava o máximo ouvir Jorge Khouri e Valdir Amaral. Ouvia a jornada esportiva inteira.  Os jogos na TV eram raros, mas assistia quando passava na TV Educativa com narração de Januário de Paula.  

No rádio tinha um bordão do Waldir Amaral que dizia que a gente via o jogo ouvindo a Rádio Globo, era a mais pura verdade. O ápice era quando Denis Menezes e Danilo Bahia davam a escalação dos times que entrariam em campo. Nessa época os setoristas do times traziam os detalhes dos treinos durante a semana. Tive o prazer é o pânico de ir num jogo do Flamengo de Zico, Andrade, Adílio e Peu contra o incrível Guarani de Careca e Zenom.  Guardo até hoje as imagens na memória. O público naquele dia foi de 121 mil pessoas. O Flamengo ganhou de 2 x 1. O anel superior do estádio sacudia feito um balanço de criança num domingo no parque. Naquele tempo, pra ver jogos ao vivo, só indo aos estádios. Me lembro que meu amigo de Teresópolis, Beto, nos levou ao Maracanã. Eu, Antonio Luis, Marcelo e, creio, Serginho ou Eduardo. Uma total é necessária irresponsabilidade. Precisava viver aquela paixão por dentro e só ali vi o que significa um gol de Zico no Maracanã lotado. 

O estádio não é mais o mesmo, mas as lembranças boas residem dentro de mim como um grito de gol numa tarde de domingo com o Maracanã lotado. Esse caldeirão de emoções me formou um adulto feliz e sem ressentimentos do passado. A melhor coisa da vida é viver. Tomara que agora, depois da pandemia, possamos voltar a ter as velhas e boas experiências, como ir a um estádio pra ver o time que se ama.