Com o lançamento da publicação Tráfico de Mulheres e Meninas: educação popular feminista para implementar políticas públicas, a Associação Mulheres pela Paz compartilha a experiência do projeto “Tráfico  de Mulheres e Meninas: educação popular feminista para implementar políticas públicas“, desenvolvido em 2018 e 2019, com ações em dez cidades do estado de São Paulo: Santo André, Santos, Campinas, Ribeirão Preto, Sorocaba, São Sebastião, Marília, São José dos Campos, Campos do Jordão e São Paulo.

Além dos relatórios sobre as atividades realizadas, a publicação traz textos de Vera Vieira (diretora executiva da Associação Mulheres pela Paz), Maria Amélia de Almeida Teles (fundadora da União de Mulheres de São Paulo), Silmara Conchão (professora da Faculdade de Medicina do ABC), Luana Cristina Ferreira de Oliveira (vice coordenadora do Instituto Lélia González), Thara Wells Corrêa (presidenta da ATS – Associação Transgêneros de Sorocaba), Flávio Urra (psicólogo e coordenador do Programa E Agora José?) e Tatiana Pinangé (pedagoga e colaboradora do movimento de prostitutas da Paraíba).

Leia a seguir o texto de Apresentação assinado por Vera Vieira e Clara Charf:

Apresentação

Uma construção conjunta de teoria e prática para avançar no enfrentamento ao tráfico de mulheres e meninas

Esta publicação é um instrumento de multiplicação contendo a experiência do projeto “Tráfico de Mulheres e Meninas: educação popular feminista para implementar políticas públicas“, que foi desenvolvido nos anos de 2018-2019, com atividades de campo em dez cidades do estado de São Paulo: Santo André, Santos, Campinas, Ribeirão Preto, Sorocaba, São Sebastião, Marília, São José dos Campos, Campos do Jordão e São Paulo (evento final). Foram realizadas oficinas, painéis públicos, materiais didáticos e intervenção nos diferentes meios de comunicação de massa, com conteúdos alicerçados na constatação de que a trágica realidade do tráfico de pessoas é uma questão de gênero – mais de 70% das vítimas são mulheres – com as interseccionalidades de classe social, raça-etnia, orientação sexual e identidade de gênero.

Com as atividades educativas, de articulação de integrantes da rede de serviços, além da conscientização da população em geral, buscou-se implementar ações que visem políticas públicas efetivas nos âmbitos da prevenção, repressão, responsabilização e atendimento às vítimas. As atividades foram desenvolvidas com base na metodologia de educação popular feminista, cuja construção é dialógica, envolvendo lideranças efetivas ou potenciais, com poder de multiplicação, dos diferentes segmentos, que atuam junto a ONGs, órgãos públicos, universidades, instâncias legislativas, além da população em geral. Esse envolvimento conjunto se dá nas três fases consideradas pela metodologia: antes, durante e após.

Em seu conteúdo, esta publicação apresenta tanto textos com os conceitos básicos para o aprofundamento da temática, os quais se entrelaçam na metodologia proposta — tais como realidade do tráfico de pessoas, feminismos, relações sociais de gênero, racismo, LGBTfobia, masculinidades e prostituição —, quanto os destaques das especificidades da produção de cada localidade. Ao final da experiência em cada cidade, foi possível elaborar uma lista com sugestões de ações e políticas públicas necessárias para o enfrentamento ao tráfico de mulheres e meninas.

É importante ressaltar que, paralelamente às oficinas descentralizadas com lideranças efetivas ou potenciais, foi realizado um painel público reunindo especialistas na temática, a população em geral e os meios de comunicação de massa, visando a alcançar um público mais amplo e heterogêneo. Conseguiu-se, assim, cooptar um público maior para a luta conjunta pelo enfrentamento ao tráfico de mulheres e meninas, uma das expressões da violência de gênero, que é considerada a mais forte consequência da construção assimétrica das relações sociais de gênero, colocando o homem em condição de superioridade à mulher.

E por falar nas mídias, o trabalho de intervenção foi previsto desde a fase preparatória das atividades. Houve o entendimento conjunto com as lideranças locais para o levantamento das possibilidades de incidência nos diferentes meios de comunicação de massa, incluindo televisão, jornais, revistas, rádios e internet. Em alguns locais, as atividades se tornaram um dos assuntos principais dos noticiários. Foram, também, o tema do momento nas redes sociais, que são essenciais para uma estratégia feminista de intervenção comunicacional a distância, pois elas se tornaram o ancoradouro de produção e difusão independentes, consolidando uma cultura de participação que expressa, de forma inovadora, valores e atitudes primordiais à evolução da cidadania plena.

Para levar adiante todas as ações deste projeto, a Associação Mulheres pela Paz (AMP) contou com a importante parceria nacional de algumas entidades: Rede Mulher de Educação, Asbrad – Associação Brasileira de Defesa da Mulher, da Infância e da Juventude, União de Mulheres de São Paulo, Geledés Instituto da Mulher Negra, Elas por Elas Vozes e Ações das Mulheres. Em todas as localidades, houve a imprescindível parceria de cerca de dez entidades governamentais e não governamentais, além de representantes do legislativo, sem o que não seria possível a realização das atividades. A verba do projeto é fruto de uma emenda parlamentar da deputada federal Luiza Erundina, tendo o apoio da Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres, do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, do Governo Federal.

Em resumo, espera-se alcançar os seguintes resultados: a) Contribuir para a ampliação e o acúmulo da discussão sobre o tema do tráfico de mulheres dentro do movimento feminista e na sociedade como um todo; b) Aumentar a sensibilidade da mídia e da opinião pública sobre a gravidade dessas questões, como consequência das desigualdades de gênero; c) Embasar políticas públicas de prevenção, repressão, responsabilização e atendimento às vítimas, priorizando ações voltadas para os direitos humanos; d) Considerando-se o preconceito e a criminalização das vítimas, contribuir para implementar uma dinâmica de construção/ desconstrução de conceitos chaves relacionados ao tráfico de pessoas, com atores diversos, visando à desvinculação das leis de crime organizado e de migração; e) Aumentar a sensibilidade da opinião pública, mídia, gestores públicos e lideranças dos movimentos sociais sobre a gravidade do tráfico de mulheres como resultante das desigualdades de gênero, classe, raça, orientação sexual/identidade de gênero e geracional na sociedade, bem como do tráfico de pessoas em geral; f) Difundir amplamente as informações sobre os riscos que podem levar ao tráfico de mulheres; medidas de prevenção; o Disque 100 e o Ligue 180, da SNPM; g) Fortalecer a rede de serviços contra o tráfico humano, tanto em âmbito das organizações governamentais como não governamentais e de universidades, com vistas a ampliar a luta pelo enfrentamento do tráfico sexual e, logo, da violência contra a mulher.

Esta experiência adiciona-se aos cinco anos de aprofundamento do tema pela Associação Mulheres pela Paz, com atividades em todas as regiões brasileiras e uma pesquisa nacional inédita, qualiquantitativa, realizada em parceria com o Datafolha Instituto de Pesquisas, intitulada “Percepção da Sociedade sobre o Tráfico de Mulheres”, cujos resultados são a base da atual iniciativa.

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