Por Lilian Campelo/Brasil de Fato

Para lideranças, a questão da saúde está muito atrelada à demarcação de terra e segurança alimentar

“A princípio o que se percebe é que estão fazendo de uma forma inadequada porque não estão passando essas deliberações pelos conselhos locais e distritais, o que na prática pode inviabilizar as ações uma vez que elas ocorrem na ponta”. É o que diz Roberto Liebgott, presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi-Sul) e membro do Cisi, instância criada pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS) e tem como papel estudar e analisar as políticas de saúde indigenista e fazer as recomendações ao CNS, que por sua vez delibera.

As propostas apresentadas pegaram o presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena (Condis –Guamá-Tocantins Pará), Pina Tembé de surpresa e conta que mais uma vez o governo não trata a saúde indígena como deveria e explica que não basta tratar a doença com meditas curativas enquanto comunidades inteiras sofrem e lutam pela demarcação de seus territórios.

“Queria que a gente fizesse essa prevenção muito antes, antes do bebê nascer, antes da mulher está grávida, porque a saúde indígena está muito relacionada com a questão da terra, ela está muito relacionada com a questão do viver das comunidades, ela está muito relacionada a questão da alimentação da comunidade, da preservação cultural daquele povo”, conta Tembé que mora na Aldeia Ytuaçu, pertencente ao território indígena Alto Rio Guamá localizado no município de Santa Luzia do Pará e que atualmente possui 80% do seu território invadido.

O portal Saúde apresentou dados em que 65% da mortalidade infantil indígena é provocadas por doenças evitáveis como por exemplo doenças respiratórias, parasitárias e nutricionais, casos em que as ações irão incidir. O número de óbitos de crianças indígenas antes de completar um mês de vida é 31,28 por mil nascidos vivos, comparativamente três vezes maior que a média nacional, 13,8.

O Ministério da Saúde estabeleceu cinco metas como como expandir para 90% o acompanhamento alimentar e nutricional de crianças indígenas menores de 5 anos. As metas estão alinhadas a uma série de ações como, por exemplo, a elaboração de metodologias para a distribuição de kits denominados de Crescimento e Desenvolvimento Infantil e que deveram conter suplementos, medicamentos e equipamentos de monitoramento nutricional.

Foto Daniel Zanini.

Foto Daniel Zanini.

Diversidade x receita pronta

Diante de uma diversidade étnica, linguística e cultural que as comunidades indígenas abrangem –  o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) aponta que são 305 etnias e que devem falar pelo menos 274 línguas – estabelecer receitas prontas para atender a saúde dos povos indígenas é mais uma vez passar por cima dos hábitos, costumes, desejos e das necessidades das comunidades. É o que analisa a antropóloga e professora da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, Lucia Rangel, assessora do Cimi e responsável pelo relatório de violência contra os povos indígenas, publicado pelo organismo ligado a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).

“Alguns programas governamentais precisam ouvir as comunidades, os envolvidos. Agora tem uma coisa que falta: falta médico, falta medicamento, falta equipamentos de atendimentos; isso tudo falta, então não adianta fazer programa se não vai ter o médico, se não vai ter o transporte, se não vai ter o medicamento e os equipamentos” conta Rangel.

Outra observação que a professora destaca sobre a diversidade e realidade dos povos indígenas é que muitas comunidades ainda não possuem seus territórios demarcados, o que afeta diretamente a segurança alimentar de homens, mulheres e crianças. E na contramão dessa realidade, umas das propostas do governo é elaborar um ‘Guia Alimentar dos povos Indígenas Brasileiros’, mas uma vez Rangel destaca as peculiaridades do contexto social, no qual esses povos se encontram.

“Primeiro que você vai ter diferenças muito grandes de um lugar para o outro, de uma região para outra. Você vai ter situações de comunidade que vai ter suas terras demarcadas, lugares bons para plantar, caçar, fazer criação. Já comunidades que estão acampadas na beira da estrada precisam de recursos alimentares que são as cestas básicas que são, por exemplo, farináceos, de péssima qualidade e a gente tem experiência de comunidades que são dependentes de cestas básica e tem como consequência subnutrição infantil, isso é um problema sério”, relata.

O Brasil de Fato entrou em contato com a assessoria de comunicação do Ministério da Saúde para verificar se as ações para reduzir a mortalidade infantil indígena foram dialogadas com os conselhos locais, distritais e Intersetorial de saúde indígena, contudo até o fechamento desta matéria não tivermos retorno.

Confira a versão em áudio da matéria (para baixar o arquivo, clique na seta à esquerda do botão compartilhar):

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