Introdução

Há quinze meses, comecei a escrever uma série de artigos sobre o que estava acontecendo na Ucrânia e o que provavelmente aconteceria no futuro se não houvesse um acordo de paz. Lamento dizer que a maioria das coisas que eu e um pequeno contingente de outros jornalistas atípicos alertamos sobre a grande probabilidade de ocorrer, aconteceu.

Este texto será meu último registro nesta série Ucrânia-Rússia. Mantenho as informações apresentadas em todos os artigos que escrevi sobre essa guerra. Fiz o melhor que pude para apresentar o que considerava ser a verdade e estou confiante de que o tempo confirmará a maioria de minhas descobertas.

Todos os artigos que escrevi para o Pressenza podem ser visualizados clicando em meu nome acima ou aqui.

Bakhmut foi capturada pelas forças russas

Como mencionei em um artigo que escrevi para o Pressenza há três meses, Bakhmut, a autointitulada “cidade-fortaleza” da Ucrânia, esteve à beira da captura russa durante a maior parte de 2023.(1) Em 22 de maio, Bakhmut foi totalmente tomada pelo Grupo Wagner, uma organização paramilitar russa que vem lutando para tomar Bakhmut durante a maior parte de 8 meses.(2)

Bakhmut, como você deve se lembrar, é a cidade que o presidente da Ucrânia, Vladimir Zelensky, descreveu como “um caminho aberto” para a captura de outras cidades ucranianas importantes, caso fosse tomada pelas forças russas.

Como mencionei há três meses em meu artigo “Conheça os rostos da morte”:  “Bakhmut fica no topo das principais linhas de comunicação que ligam as várias partes do sistema de defesa ucraniano. Se os russos capturarem esse terreno elevado, poderão posicionar seus sistemas de artilharia lá. Isso possibilitará o direcionamento claro e o bombardeio de Kramatorsk e Sloviansk, as duas outras cidades-chave restantes na região de Donbas. Em resumo, quando Bakhmut cair, será extremamente difícil, se não impossível, para a Ucrânia manter a região de Donbas. Capturar essa região é um dos objetivos centrais da missão de operações especiais da Rússia e de sua invasão da Ucrânia.”

Os neoconservadores da Casa Branca respondem à ameaça de derrota iminente

Após os oito meses de “moedor de carne” em Bakhmut, o que restou do exército ucraniano está agora completamente desguarnecido e massivamente desarmado por seus oponentes russos. Em resposta à enorme perda de mão de obra e munição da Ucrânia nos últimos meses, (3) o presidente Biden anunciou o envio de mais uma “arma maravilhosa” para a Ucrânia, um grupo de caças F16.(4) Não importa que esses jatos levem até um ano inteiro para aprender a operar com competência. Os EUA, disse Biden, “investirão em um programa de treinamento para que os pilotos ucranianos aprendam a pilotá-los”.

Além disso, surpreendentemente, o conselheiro de segurança nacional Jake Sullivan anunciou outro dia que o Pentágono acabou de descobrir três bilhões de dólares que, de alguma forma, foram ignorados até agora. Outros três bilhões de dólares, além dos 119 bilhões de dólares de dinheiro do contribuinte americano que já foram alocados à Ucrânia para continuar a munir suas forças armadas e pagar os salários e as pensões de seus burocratas, foram localizados bem a tempo de acompanhar a décima primeira rodada de sanções econômicas do Ocidente contra a Rússia.(5)

O fato de as dez primeiras rodadas de sanções contra a Rússia terem saído pela culatra, empurrando a maior parte da Europa para a beira da recessão, enquanto as perspectivas econômicas da Rússia cresceram, não dissuadiu Biden, Sullivan, Blinken e Nuland nem um pouco.(6)

De fato, o presidente Biden começou a pressionar a Ucrânia a realizar a grande ofensiva que prometeu empreender no início deste ano. O fato de que a Ucrânia perdeu a maior parte de seus melhores combatentes e agora depende em grande parte de reservas recém-treinadas com pouca ou nenhuma experiência de batalha não parece importar para Biden. O que importa para Biden, Nuland, Sullivan e Blinken é a “vitória total”, não importa quantos milhares de ucranianos morrerão desnecessariamente no processo de (não) alcançá-la.

Enquanto isso, no campo de batalha na Ucrânia

Pelo menos 250.000 soldados ucranianos morreram nos últimos quinze meses. Acrescente a esse número aproximadamente mais 250.000 soldados que ficaram gravemente feridos e não puderam retornar à batalha. O exército russo também sofreu baixas consideráveis, mas não chegou nem perto do número de baixas que a Ucrânia sofreu. De acordo com o cruzamento de estimativas que venho estudando, ao longo dos últimos quinze meses, a Rússia perdeu 1 para cada 5 soldados que a Ucrânia perdeu em batalha.(7)

*Deve-se observar que minha estimativa é particularmente conservadora em comparação com os números de 7 para 1 e até 10 para 1 apresentados por um número considerável de analistas e especialistas militares.(8) De qualquer forma, por qualquer padrão, 5 para 1 é uma proporção insustentável em uma guerra de desgaste, especialmente considerando o fato de que a população da Ucrânia é menos de um quarto da população da Rússia.

Os analistas de guerra ocidentais e a mídia ocidental enganaram o público ocidental

Para explicar completamente como e por que a mídia ocidental e os analistas ocidentais (em geral) não entenderam a estrutura dessa guerra, seria necessário um artigo inteiro apenas sobre esse assunto. Em resumo, a maioria dos “especialistas” ocidentais não entendeu ou fingiu não entender os motivos, as táticas e o plano geral da Rússia.

Após uma tentativa inicial (inegavelmente) fracassada de neutralizar a liderança ucraniana em Kiev a fim de produzir condições que precipitassem um acordo rápido, a Rússia mudou rapidamente para seu Plano B na primavera de 2022. O Plano B era/é ) destruir metodicamente o exército ucraniano da maneira mais circunspecta e cuidadosa possível, usando uma estratégia lenta de atrito. b) “Libertar” a parte russa da população ucraniana dos 8 anos e meio de destruição e morte a que foram submetidos nas mãos de um governo fantoche instalado pelo Ocidente, uma parte do qual é de origem neofascista, e c) eliminar todos os elementos da facção neofascista/nazista mencionada acima dentro do governo ucraniano.(9)

*Lembre-se de que os objetivos mencionados acima não são objetivos inventados por este escritor. Os objetivos mencionados acima foram e ainda são os objetivos abertamente divulgados pelo Estado russo. Estou mencionando isso para evitar a tendência sofismática, uma tendência que a liderança e a mídia ocidentais incentivam constantemente, de associar imediatamente o mensageiro à mensagem.

O que quero dizer aqui é o fato de que as primeiras representações do Ocidente de como Putin e o exército russo são ineptos, desorganizados e psicopatas estavam longe de ser verdadeiras. Pelo contrário, a Rússia demonstrou claramente o fato de que é uma força militar formidável, extremamente bem abastecida e organizada. Independentemente do que se pensa de Putin e da Rússia como país, não há mais relevância em negar a força e a eficiência do exército russo.

O povo incrivelmente corajoso e sincero da Ucrânia foi traído e usado como bucha de canhão pelos EUA e pela OTAN

É muito provável que dezenas, senão centenas de milhares de ucranianos morram nos próximos seis a doze meses para que os neoconservadores ocidentais da Casa Branca possam (conscientemente) prolongar esse massacre da população ucraniana até o início da temporada de eleições no ano que vem.

A menos que! A menos que, de alguma forma, nós, a maioria da humanidade, possamos assumir uma posição realmente unida contra essa guerra por procuração sociopata e sem direção que tem sido alimentada, no fundo, por uma ideologia neocon hegemônica absolutista que está enraizada em um desejo por mais e mais e mais poder e lucro.

Lucro para quem? Lucro para uma elite ocidental super-rica e isolada que passou a maior parte de quatro décadas comprando a mídia e comprando o governo. Não há mistério em nada disso. Aqueles que ocupam o topo do complexo industrial militar corporativo do Ocidente estão ganhando muito dinheiro com essa guerra por procuração.(10) Seu objetivo é mantê-la pelo maior tempo possível.

Epílogo e o que vem a seguir

Nos próximos artigos, vou me concentrar mais em escrever sobre possíveis soluções do que sobre problemas persistentes. Sou grato por ter tido a chance de apresentar esta série de relatórios sem obstrução, sem qualquer censura. Obrigado, Pressenza, por essa oportunidade!

Vou terminar aqui com um parágrafo que já apresentei antes porque, bem… porque eu gosto dele.

“A grande maioria da humanidade sabe muito bem o que quer. O que queremos é paz. O que queremos é amizade. O que queremos é aprender sem limites. O que queremos é uma irmandade reconhecida, uma fraternidade reconhecida de todos os seres humanos. Nada vai parar esse processo milenar de superação do sofrimento e da violência, não importa como as coisas se apresentem em determinados momentos. A evolução humana continuará.”

CITAÇÕES:

1- https://www.washingtonpost.com/world/2023/03/05/bakhmut-ukraine-russia-war-donetsk/

2-https://www.youtube.com/watch?v=937wk3W15dg

3-https://www.bloomberg.com/opinion/articles/2023-04-28/ukraine-and-the-pentagon-are-using-ammo-far-faster-than-us-makes-it

4- https://www.bbc.com/news/world-us-canada-65649471

5-https://www.epc.eu/en/publications/11th-package-of-EU-sanctions-Focusing-on-circumvention~50d944 

6-https://carnegieendowment.org/2023/02/28/backfire-global-ripple-effects-of-u.s.-sanctions-event-8041

7- https://www.cnbc.com/2023/04/07/us-reviewing-whether-ukraine-war-documents-were-leaked.html 

8-https://www.youtube.com/watch?v=RDi4bt_0058&t=1380s 

9- https://www.cnn.com/2022/03/29/europe/ukraine-azov-movement-far-right-intl-cmd/index.html

10-https://www.marketwatch.com/story/raytheons-profit-more-than-doubles-as-ukraine-war-boosts-defense-budgets-11674589555 


Traduzido do inglês por Victor Hugo Cavalcanti Alves