Está aberta a temporada de demagogia e mentiras a todo custo, a fim de garantir a (re)eleição no Brasil. Neste contexto, o Presidente da República ocupa o topo na lista dos que se aproveitam das necessidades básicas do povo para barganhar o voto, transformando aquilo que deveria ser direito inalienável em moeda de troca.

Aproveitando-se da pouca memória do povo em geral, muitos agentes políticos ocupantes de cargos eletivos usam os períodos eleitorais para tratar a população eleitora como se fosse os “cães de Pavlov”. Para quem não sabe, o médico russo Ivan Pavlov (1859-1936), em uma de suas experiências científicas, usou de uma sineta para que cachorros associassem o som desta à fome/comida. Neste sentido, todas as vezes que os animais eram alimentados, o cientista tocava a sineta e, dessa forma, quando ouviam aquele som, os cães babavam famintos, mesmo que os pratos estivessem vazios.

Para Pavlov, era válido o estudo do ser humano a partir de dados obtidos de experimentos feitos com cães acerca da atividade psíquica das glândulas salivares. De acordo com ele, o principal ensinamento desse experimento, no entanto, é que, se usamos o estímulo adequado, podemos conseguir que respostas involuntárias sejam dadas de acordo com a nossa vontade. Em outras palavras, esse experimento mostrou que se a consciência e o comportamento podem ser estimulados a partir da associação, as respostas podem ser previstas e, consequentemente, manipuladas.

“Voto de cabresto”

Nas ruas das grandes, médias e pequenas cidades já é possível ver outdoors anunciando o Auxílio Brasil de 600 reais como se fosse um presente do atual presidente da República à população vulnerabilizada do país. Mas sabemos que é, em realidade, uma medida eleitoreira que, para o Presidente, funcionará como um estímulo capaz de levar certa parcela do eleitorado a comportar-se como os cães de Pavlov no momento da escolha de seu candidato à Presidência nas próximas eleições.

Isso podemos comprovar quando realizamos uma retrospectiva e vemos, por exemplo, que, no auge da pandemia da Covid-19, em 2020, ele se colocou contra a concessão do Auxílio Emergencial de 600 reais, que foi aprovado mesmo contra sua. Em outubro daquele mesmo ano, quando se discutia a redução de 50% do benefício, o chefe do governo federal disse, textualmente, a seus apoiadores: “Sei que os 600 reais são pouco para quem recebe, mas é muito para o Brasil. São 50 bilhões por mês. Tem que ter responsabilidade para usar a caneta Bic aí. Não dá para ficar muito tempo mais com este auxílio porque, realmente, o endividamento nosso é monstruoso.”

Se olhamos mais a fundo, veremos que, em 2010 o Presidente – naquela época era Deputado Federal pelo Rio de Janeiro – afirmava que a parcela do eleitorado que recebia o benefício e votasse no governo daquele momento estaria contribuindo para aquilo que conhecemos como “voto de cabresto”. Em 2011, afirmou que o Bolsa Família não era nada mais do que “um projeto para tirar dinheiro de quem produz e dá-lo a quem se acomoda, para que use seu título de eleitor e mantenha quem está no poder […]”.

Na sua versão original, o “voto de cabresto” era assim denominado quando, na época do coronelismo no Brasil (“República Velha” ou Primeira República, 1889-1930), os coroneis (grandes fazendeiros) induziam o povo humilde, por meios pacíficos ou mesmo violentos, como ameaça de morte, a votar em seus candidatos. Na atualidade, essa modalidade de voto se materializa através da concessão de medicamentos, de consultas médicas, de materiais para construçã, entre outros, como o Auxílio Brasil.

Jogada astuta

O presidente da República, que deseja continuar no cargo, agora é o “salvador” das pessoas necessitadas, pois conseguiu que o Congresso Nacional votasse, às portas das eleições, um benefício chamado Auxílio Brasil, o mesmo que Bolsa Família, só que com outro nome, no valor de 600 reais, que será pago até o final deste ano.

Foi uma “jogada” muito astuta, pois, caso o Congresso não aprovasse o Projeto emitido pelo Poder Executivo, o Presidente colocaria a população pobre contra o Legislativo, acusando-o de ter impedido que o povo vulnerabilizado tivesse ajuda do governo. Se aprovada, como foi, o colocaria na condição daquele que se preocupa com a população mais necessitada. Aprovada ou rejeitada, a proposta do governo significaria um ganho para o mandatário, que sairia como “defensor do povo”, ainda que seu histórico, tanto na condição de Deputado Federal como na de Presidente da República, demonstre exatamente o contrário.

Ele realmente está apostando no Auxílio Brasil como o estímulo que fará parte considerável do eleitorado contemplado com esse benefício responder com o voto em sua reeleição, do mesmo modo como fizeram os cães do experimento de Pavlov quando responderam à sineta, salivando e demonstrando estar com fome, mesmo não estando na hora de comer.

Esperamos que a população pobre não responda dessa forma. Ficam aqui nossos votos para que o povo humilde e vulnerabilizado por políticas aplicadas em favor das eleites dominantes não escolha, no dia 3 de outubro, qualquer nome que não contemple em seu programa de governo a anulação das Reformas Trabalhista e da Previdência, assim como a reversão da PEC 241/2016 (a conhecida PEC da Morte) que congela por 20 anos os investimentos em setores-chave, como Saúde, Educação, Ciência e Tecnologia, entre outros.

Qualquer nome que faça “vistas grossas” a essas questões não pode ser considerado pela população eleitora brasileira para ocupar a Presidência da República. Não podemos permitir que a maioria do nosso povo viva em dificuldades e/ou na miséria. E uma coisa é certa: do governo atual sabemos que não podemos esperar nada diferente do que já estamos vendo.