MÚSICA

Por Renan Simões

 

Em 1997, o violonista Paulo Bellinati e a cantora Mônica Salmaso se uniram para recriar um dos repertórios mais instigantes e belos da música brasileira, o que culminou no melhor álbum da carreira de ambos. Embora registros da MPB tradicional ou da MIB (Música Instrumental Brasileira) possam descambar, muito facilmente, para algo dispensável ou genérico, este caminho é aqui evitado por Bellinati e Salmaso. A força das músicas abordadas, somada à competência e criatividade dos intérpretes, exala magia. O repertório em questão: os Afro-Sambas de Baden Powell e Vinicius de Moraes.

Ao longo de todo o registro, há apenas uma voz e um violão, gravados simultaneamente. Os arranjos para violão são criações brilhantes, certeiras em suas sugestões, texturas e preenchimentos. A expressividade do duo está presente em cada sílaba cantada, em cada nota tocada, em cada respiração; tudo é muito cristalino e pleno.

A releitura de Consolação, com suas rearmonizações e ambiências certeiras, nos deixa sem ar. Esta, junto a Tristeza e solidão, Canto de Ossanha e Canto de Xangô, conseguem atingir ou mesmo ultrapassar o poder das gravações originais de Baden e Vinicius. Canto de Iemanjá, por sua vez, é o único destaque que não faz muito jus à energia do original. Bocochê, Tempo de amor (samba do Veloso) e a derradeira Cordão de ouro/Berimbau apresentam arranjos portentosos, ainda que singelos. Os maus momentos ficam por conta das escolhas infelizes de Labareda e Lamento de Exú, que não funcionaram no contexto, além de Canto de Pedra-Preta, na qual fico torcendo para que termine desde o momento que inicia.

Paulo Bellinati e Mônica Salmaso, Afro-Sambas, uma bendita recriação de um ciclo glorioso de canções! Ouça, desfrute, reflita, repasse: