NOTA PRETA

Por Mauro Viana

 

As atividades socioculturais ampliam as atividades acadêmicas uma vez que, nossa sociedade vive um tempo histórico de profundas transformações, nos modelos de convivência e coexistência de diversas culturas.

Entrevista com a Professora Maria Alice Albino da Rocha Moreira

Graduada em História pela Universidade Federal Fluminense, pós-graduada em Supervisão Escolar pela UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro e pós-graduada em História da África pela Universidade Cândido Mendes, a Professora Maria Alice acaba de entrar na sala da NOTA PRETA.

Ela acumula uma vivência de 34 anos na Educação de Jovens e Adultos na Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro, atuando como professora de História no Ensino Médio, Orientador de Estudo na Formação Nacional pelo Fortalecimento do Ensino Médio e Coordenador Pedagógico.

1) Você tem uma trajetória profissional muito rica. Quais são suas primeiras ações acadêmicas?  

Minha história acadêmica é a trajetória de uma professora que transita a mais de três décadas entre o Ensino Fundamental, o Ensino Médio e na atuação de Coordenadora Pedagógica, nas escolas públicas e privadas. Ao longo desse período acompanhei muitas mudanças no sistema educacional brasileiro. Das reformas de base da educação experimentadas, destaco a orientada pela nascente Pedagogia do Oprimido, de Paulo Freire.

2) Você pode nos contar algumas particularidades destas ações acadêmicas?

Quando docente recém-formada, dei aula na comunidade de Vigário Geral, um bairro da Zona da Leopoldina, na Zona Norte do município do Rio de Janeiro. Lecionei na comunidade de 1987 a 1999 e confesso que foi um período difícil, principalmente, após a chacina de Vigário Geral ocorrida em agosto de 1993, onde a imagem dos 21 caixões no chão da favela chocou a comunidade e o mundo. Naquele momento, apesar da tristeza e do trauma, o retorno dos estudantes às salas de aula era uma forma de reagir, de começar de novo, através de práticas de inclusão e justiça social por meio da arte, da cultura e da educação.

3)  A partir das iniciativas práticas, o que você aprendeu no campo da História do Brasil?

A docência em História me faz lidar com as mudanças e permanências da nossa sociedade. Perceber o modo como as pessoas viviam nos tempos antigos e como vivem hoje, no Brasil,  bem como a relação entre aqueles tempos e os tempos atuais é ferramenta de sobrevivência. Por exemplo, quando falamos da existência do racismo no Brasil em pleno século XXI, estamos falando de mentalidades e estruturas sociais escravagistas oriundas do Brasil colonial que permanecem, ainda, nos dias atuais. Quando falamos de movimentos sociais e políticos antirracistas, estamos falando das mudanças necessárias, de produção de saberes emancipatórios sobre a questão racial no Brasil.

4) Em quais instituições você já atuou no fazer pedagógico?

Fundação logosófica em prol da superação humana, ASFOE – Associação Fluminense de Orientadores Educacionais, Seeduc – Secretaria de Estado de Educação e CEPAC – Colégio Estadual Pedro Álvares Cabral.

5)  Além dos projetos acadêmicos, você exerce alguma atividade sociocultural?

Sim. Na Marcha das Mulheres Negras  contra o racismo e a desigualdade social e de gênero no país, na Marcha de Combate à Intolerância Religiosa, que luta contra o preconceito religioso no nosso país e o direito que é garantido a todo cidadão brasileiro de demonstrar a sua fé sendo respeitado por isso e no movimento da Educação Quilombola com o objetivo de repensarmos  o papel da escola como fonte de afirmação da identidade nacional, à luz da experiência dos quilombos contemporâneos. E não poderia deixar de mencionar a pequena colaboração na Associação Cultural República do Samba, com o amigo Mauro Viana.

6) Em que medida o cultural contribui com o acadêmico?

As atividades socioculturais ampliam as atividades acadêmicas uma vez que, nossa sociedade vive um tempo histórico de profundas transformações, nos modelos de convivência e coexistência de diversas culturas. Todos os docentes devem estar preparados para lidar com o desafio de ensinar a que o aluno crie o seu próprio conhecimento, apesar da atmosfera de conflitos e da exasperação dos preconceitos e das diferenças. As atividades socioculturais colaboram na  interação do sujeito com o ambiente, com as experiências de vida e para a reflexão de ser trabalhar a diversidade cultural,  a aceitação e o respeito por essa diversidade.

7) Qual é sua metodologia de trabalho como professora de História? 

Apesar de algumas limitações, eu aplico a História Temática como metodologia de ensino, pois, me afasta das características do ensino tradicional, que privilegia, ainda, uma versão simplificadora e excludente das lutas sociais, levando os alunos a assumirem uma condição de agente passivo e receptivo do conhecimento transmitido. O encaminhamento da prática metodológica da História Temática possibilita a compreensão do processo de produção do conhecimento histórico e o desenvolvimento da ação, entre alunos e professores, de pensar historicamente a realidade que está inserido.  Nessa perspectiva, as desigualdades sociais, tanto no passado como no presente, são tratadas como fatores de possibilidade de compreensão e de transformação por meio do conhecimento histórico.

8) Quais são suas fontes de pesquisas em busca de novas autoras?

Geralmente, eu recebo dicas de amigos escritores que sabem do meu envolvimento com as causas da população negra no Brasil, indicações da Biblioteca Preta Africana, nas revistas do MAFRO – Museu Afro-brasileiro, da Afroteca Comunitária Carolina Maria de Jesus, dentre outras fontes.

9) Em que ocasiões você as aplica?

Atualmente, no meu Blog quinzenal, Blog da Alice: Ancestralidade é tudo. Blog criado com o objetivo de dar visibilidade a História da África e do negro no Brasil e demais povos escravizados. Utilizo também na docência na confecção dos planos de curso e de aula.

10)Qual é a técnica que você usa para obter os resultados esperados tanto no campo da História?

Gosto muito de dar voz às pessoas que estão diretamente envolvidas no processo de aprendizagem. É muito instigante desenvolver um conhecimento comum sobre uma situação, que integre não só os saberes dos especialistas, mas também os das pessoas comuns. Trabalho muito com debates e pesquisas, pois são técnicas essencialmente ativas, que levam o aluno a conquistar e não receber, passivamente os conhecimentos. Os trabalhos em grupo além de estimular a sociabilidade dos alunos, fomentam o debate e enriquecem a aula com a participação de todos.

Com o amigo Mauro Viana da Associação Cultural República do Samba