Em 2020, um total de 6.416 pessoas foram vítimas fatais de ações de policiais civis e militares da ativa no Brasil. Não bastasse esse desastre, a Comissão Especial da Câmara dos Deputados deu o seu aval, na última quinta-feira, 23, ao Artigo 144, Parágrafo 8º da PEC 032/20 (Reforma Administrativa) que autoriza os municípios a “constituir guardas municipais, órgãos de natureza policial”. E o mais aterrador disso tudo é que essa medida contou com o apoio de integrantes de partidos ditos progressistas.

Trata-se de um disparate, porque o país já possui demasiadas forças policiais, as quais, todos os anos, através de suas ações (com efetivos em serviço ou fora de serviço) são responsáveis por inúmeras vítimas fatais. Conforme dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública (2021), no ano passado as polícias estaduais produziram uma média de 17,6 mortes por dia. E o Brasil alcançou a maior marca de mortes em consequência de ações policiais desde que o indicador passou a ser monitorado pelo (FBSP). As menores taxas ocorreram no Distrito Federal, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Paraíba e Piauí. Enquanto que os estados do Amapá, Goiás, Sergipe, Bahia e Rio de Janeiro alcançaram as maiores.

Jovens negros são as principais vítimas

É interessante ressaltar que, entre os estados mais letais, dois são governados por partidos ditos progressistas: no Amapá, está o PDT de Ciro Gomes; e na Bahia, o PT de Lula, fato que explica o apoio de parlamentares desses partidos à Emenda que dá carta branca aos prefeitos a constituírem policiais em seus municípios.

Conforme o Anuário, as mortes ocasionadas por ações policiais no Brasil correspondem, em média, a 12,8% de todas as mortes violentas intencionais no país. Outro dado bastante relevante diz respeito ao perfil das pessoas mortas. Apesar de a população negra constituir  56,3% do total da população brasileira, ela corresponde a 79% das vítimas dessas mortes por ações policiais, na maioria jovens do sexo masculino, entre 18 e 24 anos, o que demonstra o traço racista dessas intervenções violentas.

Ao que tudo indica, os/as parlamentares que desejam implementar polícias municipais não estão satisfeitos/satisfeitas com o estrago que as forças policiais vêm produzindo no país. Querem mais. Entre os 204 deputados e deputadas que assinaram o documento com a proposição, uma parte integra partidos ditos progressistas, como PT, PC do B, PDT, PV e PSB, o que nos alerta para a necessidade de avaliarmos com muita cautela os nossos votos. O único voto contrário à Emenda, por parte deses partidos ditos progressistas foi do PSOL.

Proposições como essas vão na contramão do que o Brasil necessita. E do que reivindicam os grupos defensores dos direitos humanos. A solução para a segurança de um país passa pelas garantias dos direitos à educação, à saúde, à moradia, à alimentação, ao emprego e renda dignos. As narrativas e ações que reivindicam a violência e o desrespeito à vida, ao contrário, não devem se constituir na preocupação principal de uma sociedade que realmente deseja harmonia. E o parlamento, que deveria representar os intersses da maioria da sociedade, jamais deveria sugerir o caminho da repressão.