ENTREVISTA

por Jhon Sanchez

Apesar de ter conhecido o Luca há dois ou três anos, parece que foi há mais tempo. O meu amigo Justin Sight, o mágico, estava sempre a falar da busca espiritual do Luca e do seu grande senso de humor. Luca, médico de profissão, decidiu dedicar sua vida à escrita, e nesse sentido, sua trajetória de vida é semelhante à minha.

Assim, gostaria de conversar sobre a vida de Luca, suas motivações, visões, e sua vida espiritual, e, claro, sobre seu primeiro romance, o Green Haven, um mistério ambientado em um lar de idosos.

Inicialmente, obrigado por conceder esta entrevista.

JS: Você é um médico que sofreu uma lesão e teve que se aposentar de uma carreira de muitos anos. Acho que foi um processo complicado. Pode falar sobre isso? Que mensagem daria às pessoas que enfrentam circunstâncias semelhantes?

LDM: Esse foi um período bastante desafiador na minha vida. Pensei que havia perdido o sentido de quem eu era e como me via no mundo. Cheguei a acreditar que havia perdido minha identidade. A verdade é que ser médico foi apenas uma parte de quem eu sou. Isso ainda está dentro de mim, vanguardas que não são algo mais prioritário na minha vida. Os primeiros meses de 2018 foram sombrios e dolorosos, tanto física como emocionalmente.

O meu corpo e a minha alma ficaram muito feridos nesse processo. Quando você está em meio à escuridão desse jeito, só há uma escolha a fazer: encontrar forças para enxergar o seu verdadeiro eu ou permitir que a escuridão te consuma por inteiro. Sempre adorei escrever, e escrever Green Haven, foi o caminho de volta da escuridão repentina em que me encontrava. O único conselho que posso partilhar com quem se encontra nesse tipo de escuridão é nunca parar de procurar a sua força interior e não ter medo de confiar em si mesmo para usá-la.

JS: Você disse que tirou a ideia do romance de um sonho. Sonhou a história toda do princípio ao fim? Ou sonhou com alguns elementos do romance? Ou foi apenas com um dos personagens?

LDM: Green Haven veio para mim em um espaço que chamo de “O Meio-Termo”. É aquele momento em que ainda estamos acordados, mas prestes a pegar no sono. Mas, penso que há aqui um ponto mais crítico que tem de ser focado. Temos de estar prontos e dispostos a ouvir a voz ou mensagem que nos espera nesse espaço temporal. Acho que estava pronto.  Quanto ao “download” de todo o romance num sonho, não, ele veio em pedaços. Quando comecei a escrever a história de Green Haven, apenas tomei nota de algumas falas. Era como se os personagens falassem e eu escrevesse. Mesmo na edição, senti que era guiado para fazer mudanças. Agora, também é verdade que muitas correções foram feitas para aderir às regras da palavra escrita, mas não é bem disso que estamos falando aqui. A essência do diálogo, da ação e da própria história se desenrolaram como se estivesse sendo contada e eu estava bem ali, vendo tudo.

JS: Você é uma pessoa espiritual que também fala em público sobre automotivação. Por que decidiu escrever e publicar um romance de mistério? Por que queria seguir esse caminho e esse gênero literário?

LDM: Muito do que se pensa sobre o que seja ser um autor e médico ao mesmo tempo, sendo uma pessoa espiritual e uma pessoa pública, tudo isso apenas faz parte de quem eu sou. São os chapéus que eu uso. Green Haven foi-me dado para escrever, e foi isso o que eu fiz.  Pode ter sido pelo fato de que eu precisava de algo que não era nada do que eu pensava ser na época. Escrever esse romance foi um trampolim para desbloquear a outra parte de quem eu sou.

JS: por que lemos romances de mistério? Acha que o mistério nos ajuda a denunciar instituições sociais e políticas?

LDM: Em minha opinião, lemos romances porque eles representam uma válvula de escape de qualquer lugar de onde desejamos sair por algum tempo. Não acho que a diversão seja necessariamente uma coisa má. A diversão, intencionalmente programada, pode ser uma forma de dar alguns passos atrás para enxergarmos uma solução para algo a que talvez tenhamos que responder. E os romances de mistério podem nos ajudar a enxergar questões sociais e políticas, mas não tenho certeza de que eles sirvam para que denunciemos algumas instituições. Pelo menos não foi essa a minha intenção.

JS: Eu assisti à entrevista que você concedeu à Queenie Clem, a jovem, e me perguntei o quanto você pode revelar durante uma entrevista sobre um romance de mistério?

LDM:  Já concedi várias entrevistas e fui questionado sobre o mesmo assunto em todas elas. Fiz a mesma pergunta ao meu editor. A melhor resposta que posso dar é compartilhar o suficiente do enredo para que a pessoa que estiver assistindo à entrevista se mantenha interessada. Saber onde terminar cada capítulo do romance foi mais simples do que responder a perguntas como essa.

JS: vamos falar sobre lares de idosos. O romance assinala uma disparidade significativa nos padrões de cuidados. Temos instalações de cuidados verdes que, por uma taxa vitalícia, as pessoas ricas podem viver como se estivessem num palácio real. A sua intenção foi fazer um comentário social / político sobre o padrão de Cuidados dos lares de idosos nos Estados Unidos? Será que a COVID desmascarou uma dura realidade sobre a disparidade dos lares de idosos neste país?

LDM: De forma alguma. Minha intenção não foi condenar nenhum lar de idosos. Trabalhei durante mais de 25 anos em lares de idosos e, na maior parte, o pessoal de saúde se esforça para se fazer o melhor trabalho que podem. O único aspecto que Green Haven captura é que uma grande quantidade de familiares que coloca um ente querido em um desses lares para idosos passa menos tempo visitando o seu parente abrigado com o passar do tempo.  As razões são muitas, mas acredito que a tristeza, a culpa e, em alguns casos, a falta de firmeza desempenham papéis-chave. Não pretendia culpar ninguém. Apenas constatei uma circunstância que existe. A COVID fez agravar a situação. Em qualquer caso em que as pessoas tenham que conviver em uma comunidade fechada, a doença pode se espalhar rapidamente. O que temos que entender é que a COVID não aconteceu apenas nessas comunidades. A doença foi introduzida por um vetor externo, e depois o pessoal médico e os profissionais de saúde têm que lidar com isso. Enquanto eu trabalhava nesse tipo de instituição, uma das maiores ameaças eram os surtos de infecções, e eles geralmente vinham do ambiente externo.

JS: concorda que a psicanálise desempenha um papel importante na literatura criminal?

LDM: Geralmente, sim. Se estiver falando de literatura policial verdadeira, isso não é da minha alçada. Como autor de mistérios, crio um espaço bem lá no fundo para mantê-los separados em camadas profundas que reservo para cada personagem, sejam o principal e os coadjuvantes. Isso me permite saber e decidir o que fazer com eles, definir quem eles são e como podem responder a situações que encontram no curso do romance.

JS: nessa nota, o que o romance nos diz sobre você? Você acha que esse romance reflete a sua vida de alguma forma?

LDM: Nenhum personagem é uma pessoa específica e eu me incluo nisso. Presto muita atenção para não criar personagens à semelhança de ninguém em particular. Tendo sido um médico e co-fundador de duas organizações de crescimento pessoal e conheci muitas pessoas com personalidades bastante distintas. Green Haven reflete muito sobre as pessoas que conheci na minha vida. Talvez o personagem principal, a enfermeira Arden, guarde uma pequena semelhança comigo, na medida em que ela aprendeu a fazer o seu trabalho, e isso é quem ela era até que ela teve que soltar-se de todas as amarras que a prendiam para descobrir o que realmente ela queria na vida.

JS: Todos nós enfrentamos o envelhecimento e a decadência e, com isso, a possibilidade de sermos pacientes em um lar de idosos. As pessoas podem ter medo de serem sujeitas a abusos e maus tratos. O que você poderia dizer para essas pessoas?

LDM:  Se estiver pensando em colocar um ente querido em um lar para idosos, pesquise bastante. Pergunte por aí, pergunte a quem conhece esse tipo de instalação ou aos que já viveram em uma delas. Com o envelhecimento da nossa população e a partir da necessidade de reabilitações pós-operatórias prolongadas, por exemplo, muito mais pessoas terão que permanecer nesse tipo de instituição por pouco tempo, pois elas têm os recursos para isso.

JS: fale-me dos seus próximos projetos. Sei que tem dois romances a caminho, mas será que vem por aí algum livro ou projeto de automotivação/espiritual?

LDM: Isto traz de volta a questão que quero muito compartilhar. Sim, há dois romances a caminho. O primeiro é outra história baseada em medicina e estou com ele na fase de edição. O segundo, que estou escrevendo agora, é um romance bem-humorado de época. Em relação a algum livro espiritual, minha espos]a, Laura e eu escrevemos um mini livro, há muitos anos, chamado “SteppingUp.” Qualquer pessoa interessada em lê-lo pode encontrá-lo na Amazon. Por ora não tenho mais nada. Ao contrário dos meus blogs, não faço uma escolha consciente de ir buscar os livros que escrevo. Eles é que vêm a mim.

JS: Para encerrar, temos muitas pessoas por aí que desconfiam das instituições médicas, das vacinas e de outros tratamentos médicos. O que poderia dizer para essas pessoas?

LDM: Não cabe a mim dizer a qualquer pessoa o que ou em quem confiar ou não. Estive na área médica durante muito tempo e, por isso, as minhas opiniões são tendenciosas. Também é por isso que me abstenho, exceto para dizer que não se trata só de TI quando o assunto são as vacinas. É sobre familiares, amigos e a comunidade à volta. Temos de voltar para um mundo em que não tenhamos de nos esquivar uns dos outros.  Somos criaturas sociais, então vamos voltar para um mundo onde vivamos sem medo de morrer por causa das interações humanas. É também por isso que temos que nos curar juntos.

Obrigado por conceder esta entrevista. Também foi muito bom vê-lo durante a arrecadação de fundos da Virtual Pressenza. A atuação do Justin Sight foi incrível. Espero que da próxima vez nos encontremos cara a cara (mas também pode ser no Face2Face, o programa de televisão de David Andersson. Risos)

Sobre os autores

Luca DiMatteo, o escritor, acredita que colocar palavras no papel não seja uma válvula de escape, mas sim uma aventura.

Foi médico por mais de 25 anos, antes de se aposentar. Passou muitos anos trabalhando em lares de idosos e em instituições periféricas de apoio aos idosos. Além disso, é co-fundador de duas organizações de crescimento pessoal, teve sua própria coluna e foi publicado em revistas e newsletters. Luca foi publicado em “Pressenza”, no The New Haven Register e na revista “Aspire”. É membro da Associação de Autores e Editores de Connecticut. Ao longo de toda a vida, permaneceu próximo da palavra escrita e encontrou uma maneira de torná-la parte de tudo o que ele faz.

Escrever Green Haven, a novel decorreu de uma ideia que ele teve em um sonho. De acordo com o autor, a história e seus personagens ganharam vida própria. Era como se eles estivessem lhe contando a história. Luca admite que não conseguia digitar rápido o suficiente e muitas vezes ia até muito tarde da noite para tentar pôr a conversa em dia.

“As histórias são caminhos que levam a grandes viagens. E as viagens são parte de nossas vidas. Então, escolha o máximo de caminhos que puder e desfrute do mesmo número de viagens.”

Luca tem na prancheta mais quatro romances (em andamento), além de ser o coanfitrião de uma série de podcasts intitulada The Author’s Way.

Jhon Sánchez: um colombiano, chegou a Nova York em busca de asilo político, onde agora é advogado. “United Tombs of America”(Tumbas Unidas da América), um de seus contos, está disponível na edição de inverno do Midway Journal. No ano passado, a Teleport publicou seu conto “Handy”(Acessível). “The DeDramafi”, foi publicado no The Write Launch e o Storyland o republicou na edição 36. Ele foi premiado com Horned Dorset Colony para 2018 e o Programa de Residência Artística Byrdcliffe para 2019. Em 2021, New Lit Salon Press publicará sua coleção “Enjoy Pleasurable Death and Other Stories That Will Kill You”( Desfrute de uma morte prazerosa e outras histórias que vão matar você) para atualizações, visite a página do Facebook @WriterJhon


Traduzido do inglês para o português por Mychelle Medeiros/ Revisado por José Luiz Corrêa