“As tentativas de acabar com a Lava Jato representam a volta da corrupção. É o triunfo da velha política e dos esquemas que destroem o Brasil e fragilizam a economia e a democracia. Esse filme é conhecido. Valerá a pena se transformar em uma criatura do pântano pelo poder?”

Essas são as palavras do ex-juiz, do ex-ministro de Justiça e do “ex-candidato” a ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Sérgio Moro, publicadas em sua conta no Twitter, referindo-se às manobras do presidente da República que ele ajudou a eleger quando prendeu, sem provas concretas, Luiz Inácio Lula da Silva e o impediu de participar do processo eleitoral de 2018.

A “velha política”, ou o “loteamento” de cargos públicos, as alianças inconsequentes com o único objetivo de assumir o poder – seja na esfera legislativa ou executiva – nunca esteve tão ativa quanto agora no Brasil. Em que pese os governantes da extrema direita e seus seguidores terem vencido as últimas eleições presidenciais com a condenação dessa prática, os fatos, por si só, demonstram o quanto ela é uma realidade inegável na atual conjuntura política nacional.

Expectativas frustradas

Até aí, ainda que cause uma enorme repulsa, não surpreende. No entanto, o que causa ainda mais repugnância é o discurso demagógico do ex-juiz, ex-ministro da Justiça e ex-postulante ao cargo de ministro do STF que ousa defender a ética na política e a democracia, quando ele mesmo foi um dos principais atores no processo que se iniciou em 2014 e culminou nas eleições de 2018. Haver encarcerado Lula, com uma sentença frágil e sobretudo desprovida de provas concretas foi o maior golpe à democracia que o Brasil e a ética na política já conheceram desde o Golpe civil-militar de 1964.

Como Sérgio Moro ousa falar em tornar-se uma “criatura do pântano” (é bom que se diga que comparar-se às verdadeiras criaturas do pântano é um ultraje), referindo-se ao seu ex-chefe político, se ele mesmo transformou-se em um ser repugnante ao aceitar o cargo de ministro da Justiça logo após haver condenado o principal candidato de oposição ao governante que o nomeou?

Ocorre que suas expectativas foram todas frustradas: tanto chegar a ocupar o cargo de ministro do STF, como também, no futuro, ser eleito presidente da República, uma vez que a Lava Jato o fez, temporariamente, o homem mais confiável do País. Há um ano, pesquisa visando as eleições presidenciais de 2022 lhe colocava na liderança, com 30% das intenções de voto. Mas, como a Terra é redonda – ao contrário do que pensam seus quase futuros eleitores terraplanistas – , “a roda girou” e os planos dele “desceram pelo ralo”. Sua ambição e falta de ética lhe custaram a carreira no judiciário, assim como uma eventual carreira política.

Mais ativa que nunca

Entre outras demonstrações de que o discurso do governo de extrema direita sobre ética na política era falacioso, podemos citar sua adesão ao chamado Centrão, um grupo de partidos sem orientação ideológica definida, mas que tem como meta principal aproveitar-se de stituações que possam lhe render vantagens juntos ao Poder Executivo. Na atual legislatura esse grupo está representado por siglas como Partido Liberal (PL), Partido Popular (PP) e Solidariedade. Esses e os outros membros do grupo têm negociado apoios ao governo em troca de cargos públicos, a principal característica da “velha política”.

Mas não é somente a adesão ao Centrão que caracteriza a “velha polÍtica” do novo governo brasileiro. Há várias investigações de casos de corrupção que envolvem os nomes do presidente da República e de sua família. Somente para citar alguns, podemos listar as suspeitas de envolvimento nos asassinatos da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Martins; o chamado “Caso Queiroz”; o uso de helicópetros do governo para transportar parentes do presidente, assim como a venda excedente de energia em Itaipú.

Inclusive, há que se destacar o fato de o ex-juiz, ex-ministro e ex-postulante a ministro do STF haver pedido demissão, em abril de 2020, devido a pressões que estariam sendo feitas pelo presidente da República, junto à Polícia Federal (PF), “coincidentemente” quando seus três fillhos (o vereador, o deputado federal e o senador) estavam sendo investigados.

Como vemos, a “velha política” está mais ativa que nunca. O discurso da extrema direita contra essa prática foi nada menos do que uma estratégia eleitoreira, que visava captar a ignorância de uns, a desilusão e a ingenuidade de outros, e a despolitização da maioria do eleitorado brasileiro. Infelizmente deu certo. E causou muitos danos ao País, sobretudo à democracia.

A polarização movida unicamente pelo ódio às esquerdas; o desmantelamento do Estado enquanto ente protetor dos mais vulneráveis; as intensificações dos processos violentos; a desvalorização da ciência e da tecnologia; a adesão voluntária às políticas que destroem a soberania nacional são apenas alguns exemplos desses danos, cujas ações do ex-juiz, ex-ministro da Justiça e ex-postulante a ministro do STF Sérgio Moro e de todos e todas que colocaram esse governo no poder ajudaram, sobremaneira, a concretizar.

Mas a continuidade ou interrupção dessa etapa da história do Brasil só dependerá da luta verdadeiramente política, comandada pelas forças progressistas nas disputas legítimas que devem se dar tanto no campo eleitoral como fora dele.