Em agosto de 2017 houve uma reunião muito pitoresca, que mostra duas visões para a cidade de São Paulo, de um lado havia Zé Celso e Eduardo Suplicy defendendo um projeto de revitalização cultural e do outro lado Silvio Santos e João Dória defendendo um projeto de gentrificação para o centro da Cidade de São Paulo.

Talvez esta seja uma das controvérsias mais emblemáticas do momento atual, que mostra duas visões de cidade e de mundo, uma defendendo uma cidade multicultural e inclusiva com parques e teatros a céu aberto e outra defendendo uma cidade somente com shoppings e torres apenas para quem pode pagar.

Dinheiro vs Cultura

É curioso ver os argumentos utilizados por ambos, Silvio Santos preocupado pela propriedade e Zé Celso preocupado pela Cidade. Durante a reunião Silvio só fala em dinheiro e Zé só fala em cultura. É muito simbólico.

Reunir dois octagenários tão representativos da cultura brasileira: um milionário apresentador de TV e o ator da contra-cultura consagrado internacionalmente representando a Posse Individual vs Compartilhamento Coletivo.

Atrás de uma fachada bem-humorada Silvio alfineta e ameça Zé Celso durante toda a conversa, fala até mesmo que vai transferir a Cracolândia para lá, mas ele não arreda o pé. Enquanto isso Dória ensaia uma diplomacia mal-disfarçada, enquanto apoia descaradamente uma solução a favor da especulação imobiliária de Silvio. Suplicy por sua vez é breve e intercede a favor do Teatro Oficina, diz que já foram oferecidos outros terrenos para Silvio, mas que ele nunca aceitou trocar.

Histórico de um Antiga Disputa

O primeiro embate ocorreu em 1980. O Grupo Silvio Santos pretendia comprar o edifício do teatro para demoli-lo. Para impedir que isso acontecesse, José Celso entra com um pedido tombamento no Condephaat e, em 1982, o edifício do Teatro é tombado como bem histórico e ficou protegido.

O segundo conflito começou em 1997, quando o Grupo Silvio Santos decide construir um shopping-center ao redor do teatro. Como forma de resistência, o Teatro Oficina solicita que sua sede seja tombada a nível federal, pelo Iphan. Deseja, dessa vez, que o imóvel seja tombado como um bem artístico, o que resulta na determinação de restrições à ocupação do seu entorno. Depois de um longo processo, o tombamento é aprovado pelo Iphan em 2010.

Teatro Oficina é Patrimônio Cultural

Fundado em 1958 e reconhecido internacionalmente, o Teatro Oficina é o mais longevo grupo de teatro do Brasil e completará 60 anos de trajetória em 2018, sempre sob comando de Zé Celso. Sua sede, projetada por Lina Bo Bardi, mesma arquiteta do Masp, em parceria com Edson Elito, rendeu ao lugar o título de o mais belo teatro do mundo, concedido pelo jornal inglês The Guardian em 2015.

A arquitetura conta com uma enorme janela de vidro que dialoga com o bairro do Bixiga e a cidade de São Paulo, que agora corre o risco de ser tapada pelas torres.

O Teatro Oficina foi fundamental em diversos momentos da cena artística brasileira, foi lá que se lançou o Tropicalismo e se criou um foco importante de resistência à ditadura militar de 64, tendo sido Zé Celso preso e torturado.

Este “Castelo” será Meu…

A disputa do terreno ao lado do Oficina para empreendimentos imobiliários inspirou o argumento central da série “Castelo Rá-Tim-Bum”,da TV Cultura, na qual o Dr. Abobrinha vivia visitando o castelo mágico para tentar vendê-lo e construir prédios no lugar.

Curiosamente Pascoal da Conceição, ator que interpretou Dr. Abobrinha na série infantil,  faz coro com diversos artistas como Chico Buarque e Fernanda Montenegro no movimento #ficaoficina em defesa do Teatro Oficina e do seu entorno. Enfatiza a importância que a região teve na formação de ator e como isso mudou radicalmente a vida dele.

Na último dia 31 de Outubro foi realizado um ato na Faculdade de Direito do Largo para reverter a decisão que Condephaat teve no dia 23 de Outubro em permitir que o grupo Silvio Santos possa construir três torres ao redor do Teatro Oficina.

Foto do Ato em Defesa do Teatro Oficina no Salão Nobre da Faculdade de Direito da USP

E você, em que tipo de cidade quer viver?

Numa cidade cinza e gentrificada cheia de torres fechadas?
Ou numa cidade multicolorida repleta de praças e teatros?