Aisha Saifi e Yifat Susskind 8 de junho de 2017 para openDemocracy

Guerras foram travadas, muros construídos e uma política de segregação construída. Mas nós compartilhamos uma crença comum – que a paz é possível. Nós nos recusamos a sermos inimigas.

Após passar por inúmeros postos de controle e por um muro israelita de mais de 7 metros de altura, nos encontramos na laje de Aisha, onde planejamos um churrasco entre nossas famílias. Nossos filhos ficaram amigos, isso aconteceu de forma rápida e mediante uma linguagem que atravessa as barreiras entre eles. Eles ficaram juntos brincando de Lego. Nós levamos os pratos, aproveitamos o ar fresco, conversamos sobre nossas vidas e trabalho. Enquanto isso, ouvíamos ruídos das famílias palestinas no lado oeste.

Esta cena de ocupação nos mostrou o que poderia ser impossível – Yifat, uma mulher israelita, e Aisha, uma palestina, cozinhando e rindo juntas observando seus filhos brincarem. Nestes 50 anos de ocupação, guerras foram lutadas, muros erguidos e políticas segregacionistas sancionadas isso fez com que nossa amizade se tornasse extremamente improvável.

Aisha estava engatinhando em 1967, apenas aprendendo suas primeiras palavras quando Israel ocupou Gaza. O lado oeste, as Colinas de Golã e o lado leste de Jerusalém. Quando a guerra estourou, sua família se escondeu em uma caverna. Se abrigaram durante 10 dias com pouca água e comida. Apenas alguns quilômetros dali, Yifat tinha apenas algumas semanas de idade, era a primogênita, foi quando seu pai a deixou para se juntar a guerra.

Quando o conflito diminuiu, e a família de Aisha pode sair de seu esconderijo, eles encontraram metade de seu vilarejo vazio, isso se deu porque muitas famílias foram obrigadas a deixarem suas casas. Na casa de Yifat, seus pais imaginavam o tempo de seu primeiro sorriso, a terra de Israel havia sido conquistada, seria devolvida. O governo de Israel alegara que a ocupação das terras seria temporária.

Mas 50 anos depois, a ocupação continua, e tem sido difícil para a maioria das pessoas imaginar como as coisas poderiam mudar. Gaza, no passado tinha autonomia econômica. Agora é uma prisão a céu aberto. Com dois milhões de pessoas brigando para sobreviver. Fora negado seu direito a água, remédios e outros insumos básicos. No lado Oeste, onde Aisha vive, há uma teia de pontos de controle israelenses, separando as comunidades. Eles controlam as pessoas, desde as que vão a trabalho até a escola, e até mesmo mantém as mulheres que estão prestes a dar a luz e procuram por clínicas ou hospitais.

Enquanto isso, nós crescemos. De garotinhas, nos tornamos em mulheres. Nos definimos. Construímos amizades e constituímos famílias. Como a ocupação tem se mantido, nossa resistência a ela construiu o rumo de nossas vidas.

Aisha começou a ser parteira e com seu trabalho conseguiu que a próxima de gerações de bebês pudesse vir ao mundo com saúde e segurança. Ela ajuda mulheres grávidas e mães de primeira viagem presas por barreiras e as – apenas colonizadoras – rotas de acesso a tratamento médico para elas e suas crianças. Ela coordena um grupo de parteiras para a paz que é constituído por palestinas e israelitas que compartilham seus saberes sobre o parto, trocando recursos e um modelo de existência pacífica.

Yifat dedicou sua vida aos direitos humanos e, mesmo quando jovem, trabalhou como parte de um grupo palestino-israelita que busca a paz em Jerusalém. Ela documentou as violações de direitos humanos na Palestina ocupada e promoveu uma campanha pelo fim da ocupação. Como diretora da MADRE, ela passou anos ajudando organizações de mulheres em todo o mundo, incluindo o trabalho vital das parteiras pela paz.

Nosso trabalho pela paz desafia a ocupação, e nossa amizade demonstra que há outras possibilidades. Enquanto os políticos e os meios de comunicação nos contar que não devemos confiar um nos outros, que nossa amizade não pode ultrapassar o muro construído com Israel, nós resistiremos. Nós nos recusamos a sermos inimigas.

Nós sabemos que nosso verdadeiro inimigo é a ocupação que tem sido um peso em nossas vidas. Temos visto muitas crianças palestinas que retornam com olhar triste quando questionadas o que querem ser quando crescer. Elas não conseguem enxergar uma possibilidade de construção de um futuro com os muros da ocupação as cerceando. Nós ouvimos de muitas crianças israelitas que contam que desprezam seus vizinhos árabes, nunca se questionando porque pensam deste modo. Isto porque os adultos plantam a semente do medo e da tristeza e cresce a geração de ocupantes.

Teremos de plantar sementes diferentes para dar um fim a ocupação e criar um outro futuro para as nossas crianças?

Nós começamos a criar um auxílio para as pessoas que necessitam. Isto é o que a MADRE e as Parteiras para a Paz (Midwives for Peace) fazem quando ajudam mulheres, quando provem o pré-natal e o atendimento necessário para o nascimento de crianças. O básico em termos de saúde.

Fundamentalmente, nós construímos um futuro diferente para exigir o fim da ocupação. Nós nos aliamos mutuamente com ativistas que buscam a paz. Quando jovens israelenses recusarem o serviço militar, ou quando as famílias palestinas a seus vizinhos puderem fazem um acampamento pacífico no lado Oeste, convidando israelitas para fazerem parte como ativistas, não como ocupantes, eles trazem vida hoje como uma visão de paz que poderia existir amanhã.

Nós somos israelitas e palestinos, e nós temos uma crença comum que algo melhor está esperando por nós. Nós vemos as possibilidades que pairam sobre as nossas cabeças, Em algumas vezes, um vislumbre de paz é duas mulheres conversando, cozinhando e vendo seus filhos brincarem.

Pressenza – Redação São Paulo 

A luta das mulheres da região da palestina por direitos humanos é notória, no vídeo – publicado pelo QuatroV –  vemos um exemplo disso. Apesar de viverem em uma zona de guerra, esses modelos demonstram como é possível viver em confluência com outras culturas. Como a não-discriminação e a não-violência podem construir um mundo melhor. Um mundo mais justo e pacífico.