Porto, 25.11.2015: Após a reprovação pelo parlamento do programa do governo da coligação liberal conservadora, no passado dia 10 de Novembro, que implicou a rejeição deste último e abriu uma crise política, o Presidente da República (PR), Aníbal Cavaco Silva, decidiu-se ontem finalmente a convidar o Secretário-Geral do Partido Socialista (PS), António Costa, a formar governo, uma vez que este tinha sido a segunda força política mais votada nas recentes eleições de 4 de Outubro. Recorde-se que o PR tinha manifestado publicamente as suas reticências a indigitar um Governo com maioria de esquerda, tendo pedido garantias de estabilidade para o tempo de duração da legislatura.
O PS conta com o respaldo parlamentar do Partido Comunista Português (PCP), do Bloco de Esquerda (BE) e do Partido Ecologista “Os Verdes” (PEV), com quem celebrou um acordo de orientação governativa. Além destes, também o PAN (Pessoas, Animais e Natureza), votou a favor da moção de rejeição do anterior governo, pelo que poderá vir a apoiar as novas opções governativas, apesar de ter apenas um deputado.
No acordo de governação celebrado com os partidos da esquerda, são previstas uma série de medidas anti-austeritárias, como o final dos cortes dos salários dos funcionários públicos e das pensões de reforma e invalidez, além do abandono de programa de privatizações, incluindo a tentativa de reverter a recente privatização da companhia aérea nacional, TAP.
Com estas medidas, que visam pôr fim a um ciclo de empobrecimento, particularmente da classe média, o Governo espera ser capaz de promover o crescimento da economia mediante o estímulo da procura interna por via do aumento do poder de compra da população portuguesa, compensando a subida da despesa pública com o incremento da receita fiscal, de modo a equilibrar o orçamento.
Em qualquer caso, estando Portugal sujeito ao escrutínio dos credores internacionais e da União Europeia, aguarda-se com expetativa como poderá o Governo aproveitar a estreita margem de manobra para abandonar a política de austeridade sem ter de reestruturar a dívida pública. Se não o conseguir, o Governo terá de se debater entre retomar a austeridade ou renegociar a dívida, convencendo os seus aliados de esquerda, no primeiro caso, ou vencendo a esperada oposição de Bruxelas, na segunda hipótese. Se assim não acontecer, ficará a porta aberta para a convocação de eleições intercalares, sendo certo que este primeiro ano de governação será decisivo para se aferir da sustentabilidade desta opção governativa.
Não obstante, para além do histórico acordo de governação com a esquerda, que pôs termo a uma trincheira que vinha desde o final do PREC (período revolucionário em curso), em Novembro de 1975, que se seguiu à revolução democrática de Abril de 1974, António Costa está também a promover a reconciliação portuguesa com a sua história colonial, dando visibilidade aos “filhos” do antigo império no terreno político.
Com efeito, o próprio António Costa é descendente de um indiano, procedente de Goa, que esteve sob administração portuguesa até ao início da década de 1960. Além disso, António Costa convidou para Ministra da Justiça a magistrada do Ministério Público Francisca Van Dunem, angolana de origem e que será a primeira pessoa negra em funções ministeriais em Portugal. Estes factos têm a sua carga simbólica, porque é conhecido o défice de representação política das minorias étnicas em Portugal, apesar do seu relevante contributo noutros domínios sociais.
O Governo de Costa terá dezassete ministros, quatro dos quais mulheres. A renovação incide também no perfil destes governantes, já que cerca de metade não tem experiência governativa anterior e apenas dois repetem o exercício da função.