Muito se escreveu sobre o nazismo e as batalhas contra Hitler; muito se filmou sobre ofüher e o Terceiro Reich; mas nem a História, nem a Literatura, nem o Cinema haviam ainda resgatado o papel de um pequeno jornal alemão como protagonista de um dos maiores combates da história contemporânea, travada entre o diário Münchener Post, de Munique, e Adolf Hitler e seu Partido Nacional-Socialista.

Fruto de pesquisa de vários anos da jornalista brasileira Silvia Bittencourt, radicada na Alemanha, o livro A Cozinha Venenosa. Um jornal contra Hitler (São Paulo: Três Estrelas, 2013) realizou a notável proeza de reconstituir a história real e impressionante daquele jornal social-democrata da Baviera, a partir de documentos e entrevistas.

Primeiro veículo da imprensa a denunciar o perigo do nazismo e da ascensão de Hitler, com base em coberturas e artigos destemidos sobre os métodos violentos, autoritários e demagógicos empregados pelo futuro ditador da Alemanha, o Munchener Post amargou várias depredações e atentados, e seus jornalistas sofrearam perseguições e agressões, tanto pelos membros das milícias privadas (SA, SS) quanto pela omissão do governo da Bavária, durante os dez anos em que bateram de frente contra Hitler e seus apoiadores, no período democrático da República de Weimar (1919-1933).

A riqueza do livro extrapola os interessantes e instigantes detalhes do confronto em si, e ingressa no terreno da própria releitura de um período histórico que, longe de ser apenas passado, ganha relevância por seus reflexos no presente. Hitler não apenas conferia enorme importância aos meios de comunicação com forma de ascender ao poder – ele mesmo se valia de seus discursos e de seu carisma como meio de atração das massas – como se incomodava muito pelos ataques que recebia, sobretudo do Post. Este, era apelidado pelo futuro ditador alemão de “cozinha venenosa”, pois, dizia ele, o jornal “cozinhava notícias” (reescrevendo noticias velhas), sempre com veneno…

Pois, foi esse veneno do Münchener Post que não deu tréguas a Hitler, durante a década em que este preparou sua chegada ao poder. O livro mostra a fundamental, a essencial importância da liberdade de expressão como antídoto contra o autoritarismo e a manipulação; mostra – e como isso tem valor! – um Hitler humano e vulnerável, pelo embate das ideias dentro de seu próprio país, e não apenas na derrota pelas armas e pelo dia “D” dos EUA e aliados, como fomos – e somos – acostumados a acreditar.

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