Esperava-se que pelo fato de ser o anfitrião deste evento, chamado de
Rio+20, que acontece depois de 20 anos da reunião do Rio de Janeiro
conhecida como Rio 92, que o governo brasileiro articulasse e conduzisse
esta reunião com a autoridade moral para defender que o mundo revesse os
padrões insustentáveis de produção e consumo, em particular dos países
ricos, responsáveis maiores da atual crise ambiental.

Todavia o que se constatou no último ano foi um retrocesso na agenda sócio
ambiental do país, com a aprovação do código florestal (mesmo com vetos), a
redução de áreas de unidades de conservação na Amazônia para atender a
construção de grandes hidrelétricas, a intervenção no Ibama reduzindo seu
poder de fiscalização ao sancionar a Lei Complementar 140, os atropelos das
regras de licenciamento ambiental, a subserviência inaceitável do
Ministério do Meio Ambiente frente aos ataques a sua competência
constitucional. Também o país não está nem cumprindo o “compromisso
voluntário” de baixar as emissões de gases de efeito estufa em 39%. Até
aqui não cumpriu nenhum plano de redução das emissões nos 11 setores
industriais previstos. O próprio Fundo Nacional sobre Mudanças Climáticas
só recebeu R$ 5,1 milhões dos R$ 238 milhões que lhe seriam destinados.

Em contrapartida, para efeito midiático com toda a pompa que a situação
exige, e como cartão de visita para os estrangeiros que virão para a
Rio+20, o governo federal lançou no dia do meio ambiente (5/6), as portas
do inicio da Conferencia, um pacote de bondades com relação à questão
ambiental e direitos indígenas, que não trouxe nada de novo, pois as
medidas anunciadas já estavam engatilhadas. As medidas dizem respeito à
criação e ampliação de áreas de unidades de conservação (até então nenhuma
tinha sido criada no atual governo), homologação de terras indígenas,
ratificação de acordos internacionais (Protocolo de Nagoya e Convenção de
Bonn) e assinatura de decreto de “compras sustentáveis” (além do preço
menor serão levados em conta nas compras públicas produtos com menor
impacto ambiental ao longo de seu ciclo de vida).

Outra contradição evidente é que o governo brasileiro tem difundido em
fóruns internacionais, utilizando um discurso pró-sustentabilidade, que
seja contida à produção e o consumo insustentáveis. Mas dentro de casa a
ação é completamente diferente, contrária ao discurso “para inglês ouvir”.
Medidas internas têm sido tomadas tentando acelerar a economia do país
estimulando a indústria automobilística e um meio de transporte de cargas
(o caminhão) que são opostos de sustentáveis (consomem freneticamente
recursos naturais, rodam com combustíveis fósseis subsidiados, torna a vida
nas cidades um inferno). Na verdade o governo age com dupla personalidade.

Ao mesmo tempo em que lança a versão brasileira do relatório *Povos
Resilientes*, encomendado pela ONU, que faz recomendações aos governos no
rumo de um mundo sustentável, orientando a divulgarem de maneira
transparente todos os subsídios, e identificando e sugerindo a eliminação
daqueles subsídios que provocam maiores perdas dos recursos naturais,
ambientais e sociais; anuncia mais um presentão para a indústria
automobilística. Libera recursos da ordem de R$ 1,2 bilhões para as
montadoras, R$ 18 bilhões de compulsório para aumento do financiamento de
veículos, reduz o IPI para carros de até mil cilindradas até quase zero, e
cria condições de mãe para filho para a compra de ônibus e caminhões com
juros passando de 7,7% para 5,5% ao ano (é quase juro negativo) e com prazo
de financiamento dilatado de 96 meses para 120 meses. Como dizem as
autoridades econômicas, a ideia do pacote é “bombar” a economia estimulando
o consumo por meio da ampla oferta do crédito a juros menores. O setor
automobilístico é o mais beneficiado por estas medidas, pois tem o lobby
mais poderoso, detendo 20% do PIB industrial brasileiro (terceiro maior
mercado mundial).

Isso tudo sem dúvida enfraquece a posição do Brasil de cobrar ações dos
países ricos nas negociações internacionais. Mas, muito mais grave,
sinaliza que a trajetória de crescimento/desenvolvimento a que o país
aspira de verdade, que pouco tem a ver com a reorientação fundamental da
produção e do consumo, e o respeito ao meio ambiente.

Enquanto premia indústrias dos séculos 19 e 20 com os sucessivos pacotes de
desoneração, o governo sufoca as do século 21, cortando em 22% as verbas da
ciência e tecnologia, dificultando assim que o país tenha uma politica
industrial voltada para as energias renováveis solar e eólica, implicando
que sejamos meros compradores destas tecnologias desenvolvidas pela China e
Alemanha. Este é o Brasil, cujo governo fala uma coisa e age no sentido
oposto. Discursos não resolvem crises.