Enquanto voam mísseis pela Ásia Ocidental [Médio-Oriente], lembro-me da minha viagem ao Irão em 2016, durante a qual descobri um país fascinante e uma comunidade judaica dinâmica. Todos os dias me preocupo com a segurança dos meus amigos e entes queridos no Irão e em Israel. A situação é trágica e criminosa.

Muitos criticam Israel por não respeitar a tradição judaica de procurar fazer dos seus inimigos amigos. Alguns citam Zacarias (4:6): «Não é pelo poder nem pela força, mas pelo meu espírito» e Samuel: «Não é pela força que o homem prevalece» (Samuel I 2:9). No entanto, esta crítica é injusta e inadequada. Embora pretenda ser um «Estado judeu», Israel nasceu de uma revolução contra o judaísmo, independentemente da predominância de judeus que usam a kippa no atual governo. Israel segue naturalmente a lógica de todas as potências coloniais que acreditam apenas na supremacia e na dominação. Portanto, não é surpreendente que o ataque de Israel tenha o apoio sólido do G7, que é composto por países com um passado recente de colonialismo brutal e que continuam a desfrutar das riquezas saqueadas aos povos indígenas.

A agressão brutal e não provocada de Israel contra o Irão, bem como o genocídio em curso em Gaza, refletem um sentimento fundamental de insegurança. Vários pensadores judeus alertaram para esta ameaça. Um deles profetizou durante a guerra desencadeada em 1948 pela prática da limpeza étnica por parte das milícias sionistas:

«E mesmo que os judeus vencessem a guerra, […] os judeus “vitoriosos” viveriam rodeados por uma população árabe totalmente hostil, isolados dentro de fronteiras sempre ameaçadas, absorvidos pela autodefesa física. […] E tudo isso seria o destino de uma nação que – independentemente do número de imigrantes que pudesse ainda absorver e até onde estendesse as suas fronteiras – continuaria sempre a ser um povo muito pequeno, largamente superado por vizinhos hostis.» (Hannah Arendt)

Hannah Arendt lançou este aviso porque compreendia os perigos da criação de um Estado contra a vontade dos habitantes locais e de todas as nações vizinhas. Pensadores seculares e religiosos temiam que a natureza expansionista do sionismo pusesse em risco a sobrevivência física e espiritual dos judeus.

Hoje, enquanto nenhum Estado árabe representa uma ameaça militar a Israel, o Irão é apresentado como um perigo iminente. Ao contrário de Israel, que bombardeia e invade os seus vizinhos, o Irão não ataca outro país há séculos. É verdade que os líderes iranianos denunciaram a natureza apartheid do Estado israelita e apoiaram os movimentos de resistência que se lhe opõem. No entanto, as alegações de que o Irão procura destruir fisicamente Israel são claramente falsas. A minoria governante  vê muitas vezes a igualdade com os povos da região como uma ameaça existencial.

Há décadas que Netanyahu, o primeiro-ministro israelita, afirma que o Irão está a poucas semanas de se dotar de armas nucleares, embora essa alegação seja constantemente refutada pelos serviços secretos quer israelitas quer americanos. Israel, um Estado que possui centenas de armas nucleares, atacou um Estado não nuclear situado a milhares de quilómetros de distância. Além disso, o Irão estava em negociações com os Estados Unidos, o que pode ter feito parte da estratégia de Israel.

Israel usou um versículo da Bíblia para nomear o atual ataque contra o Irão: «Eis que um povo se levanta como uma leoa, salta como um leão, não descansa até devorar a presa e beber o sangue dos mortos » (Números 23:24), o que parece refletir fielmente a intenção de Israel. Israel cometeu um ataque brutal e de surpresa contra outro país, mas, como de costume, está a desempenhar o papel de vítima. Isso lembra-nos outro versículo: «Os ímpios fogem sem que ninguém os persiga» (Provérbios 28:1). Como Arendt previra, as «ameaças existenciais» a Israel podem nunca cessar, se o país continuar a equiparar a segurança a repressão e dominação.

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