MODA

Por Marrom Glacê

 

Com 19 anos de carreira no segmento, a multiprofissional recebe sua primeira indicação a um prêmio no teatro, mantém o trabalho de criação e consultoria em seu ateliê, assina uma nova série e segue realizando workshops pelo país.

 

Figurinista, empreendedora, consultora, estilista-artista e até professora. Se for listar tudo que Marah Silva faz concomitantemente, o risco é não saber por onde começar a pensar esta mulher multifuncional que, fundamentada no tabuleiro como Baiana de Acarajé, desde muito cedo já herdara a profissão de sua mãe e outras mulheres de sua família. Trabalhando desde os 14 anos, foi observando aquelas vestimentas tradicionais que a baiana de Salvador se apaixonou pela arte das linhas e agulhas e, rapidamente, sentiu a necessidade de criar, parecendo intuir as muitas possibilidades do caminho que se mostrou bem aberto e acolhedor. Atualmente, dentre tantas outras atividades, Marah está indicada pelo Júri de São Paulo ao Prêmio Shell na categoria Figurino pelo seu trabalho na peça “Viva o Povo Brasileiro (de Naê a Dafé)”.

Ao longo dos 30 anos que se estabeleceu no Rio de Janeiro, Marah já desenvolveu figurino para mais de 15 peças teatrais – dentre elas, “Para meu amigo branco”, “JORGE pra sempre VERÃO” e “Capiroto”, recentes sucessos dos palcos. Mas foi agora, aos 51 anos de vida, que recebeu a primeira indicação no teatro, resultado do trabalho que a levou a desenvolver 56 peças de roupa para a adaptação cênica de André Paes Leme para o livro de João Ubaldo Ribeiro. “Ser a única mulher negra indicada nesta categoria já é um prêmio. Eu me vejo muito na inspiração de mulheres negras que vieram antes de mim e abriram as portas, mas me vejo também como inspiração para as mulheres negras que estão vindo aí. Então, pra mim, essa indicação é coletiva. É um abraço que eu dou em nós, mulheres pretas que estamos nessa luta pelo reconhecimento de nossas artes. Tô muito feliz! Pra mim é um Grammy do Teatro Brasileiro”, vibra Marah.

A criação do figurino do espetáculo “Viva o Povo Brasileiro” teve, para Marah, um dos processos mais completos usados em sua metodologia de trabalho. “Me ver como figurinista colocando ali técnicas que eu desenvolvi foi maravilhoso. Arrisquei! E deu numa indicação, né? Foi um processo coletivo, trabalhei junto aos atores e o diretor. Ia muito aos ensaios e quis que todos participassem do processo de criação de cada personagem. Levar as cores e toda aquela alegria que está dentro do palco foi uma sensação de transformação artística, sabe? É como se eu também tivesse crescido bastante durante esse processo – e eu de fato cresci bastante. Foi lindo pra mim. Cada passo que eu dou, me leva”, reflete a figurinista indicada, que integrou a equipe de “Elza Infinita”, filme premiado com a prata na categoria Documentário Biográfico no New York Film Festivals 2022.

E, assim como essa, outras metodologias desenvolvidas por Marah tem sido levadas aos mais diversos espaços através da sua verve de empreendedora. “Atuo em projetos sociais, subo comunidades, vou a cidades pequenas ensinar ao pequeno empreendedor a entender bem o seu produto e se tornar um grande empreendedor, como hoje me vejo. E eu me uso muito de exemplo, tenho muito orgulho da minha história e de tudo que tracei até aqui”, pontua Marah, que deu seus primeiros passos na Incubadora Afro-Brasileira, um projeto social da Petrobras. “Foi lá que construí todo esse alicerce, ela que me colocou nesse eixo de poder administrar toda a minha arte, me ensinando a ser Designer de Moda. Foi lá, inclusive, que eu desenvolvi a apostila ‘Empreender para Existir’”, relembra Marah, que já levou seus conhecimentos a municípios fluminenses como Japeri, Campos Elísios, Gramacho e Duque de Caxias.

A apostila foi bem vista pela Prefeitura de Niterói e atualmente é o corpo do projeto “Mulheres Guerreiras de Niterói”, onde Marah atua em comunidades levando informações empreendedoras. “Aplicamos oficinas de Costura gerando renda e ensinando às mulheres sobre sua própria capacidade, porque o nosso primeiro trabalho é ressignificar pessoas que o sistema já largou. Então, o ‘Empreender para Existir’ é a minha voz dentro de comunidades, levando informações totalmente relevantes a quem, de fato, precisa. E neste ano o meu quadro de trabalho cresceu bastante, já estou sendo chamada pra dar aulas em Minas Gerais, na Bahia, nos interiores, nas comunidades. A minha maior felicidade é essa, ensinar o que eu aprendi. Porque, vindo de família humilde, eu sei o quanto é importante todas essas informações para quem tem um pequeno negócio”, reconhece Marah.

Imersa num movimento profissional dinâmico, além dos ensinamentos e aprendizados Marah ainda está à frente do Ateliê Cretismo, um ambiente de artes e ideias instalado no Centro do Rio de Janeiro que possui um café, promove eventos de música ao vivo, como o projeto “Cantando na Janela”, rodas de conversa e, em breve, abrigará um coworking para investir em novos artistas. É ainda o espaço onde Marah gerencia sua equipe, realiza suas criações e recebe suas clientes, que vão de artistas que veste como stylist, como Serjão LorozaDoralyce, Ana Costa, Brenda Marinho e DJ Bieta, a advogadas, médicas e gerentes de banco.

“O Ateliê é, principalmente, um lugar que acolhe o novo artista. A gente faz figurinos pra pessoas que estão começando e abraçamos estas pessoas. Quando a cliente chega no ateliê, eu não a levo diretamente para a loja. Primeiro sirvo um café e converso, aplico um questionário que desenvolvi e, através dele, tenho uma noção dos estilos que a pessoa gosta de usar. E a pessoa passa a saber disso. Então, cada pessoa que sai do Ateliê, sai sabendo um pouquinho mais sobre ela. E isso é revelador”, finaliza Marah Silva que, completando 19 anos no empreendedorismo de Moda, ainda se prepara para entregar com excelência o figurino de uma série no streaming.

REALIZAÇÕES & PREMIAÇÕES

A lista de trabalhos realizados por Marah no teatro e no cinema é extensa. Em seus 19 anos de carreira a figurinista foi responsável por dezenas de produções, tais como: “Flor de Lótus” (2009); “Panela da Marcela” (2007); “Tá Rindo de Quê” (2008); “Yabá, Mulheres Negras” (2020); “Para Meu Amigo Branco” (2023); “Cria” (2023); “Jorge para Sempre Verão” (2022); “Mãe Arrependida” (2023); “Relicário” (2010); “Reza” (2019); “Cosmogonia Africana” (2019); “Rebouças” (2022); “O Mesmo Sol” (2010); “Capiroto” (2023); “Lia e as Palavras” (2020); “Quijua” (2017); “Fé Menina” (2016); “A Mulher que Matou o Síndico” (2017); “Tereza” (2017); “Reverso” – francês (2022); “Mar de Elas – Marielle Presente” (2018).

Com o filme “A Jornada”, Marah ganhou o prêmio de melhor figurino, no Festival de Cinema Tamoio, em 2021. E em 2021 desenvolveu todo figurino de “A Menina Akili e seu Tambor Falante, o Musical”, premiado como melhor espetáculo Infanto-Juvenil na 16ª edição do Prêmio APTR Teatro, em 2022, pela Associação dos Produtores de Teatro. Resultado de uma trajetória de garra, superação e determinação.