TEATRO

Por Alessandra Costa

 

Crítica e bom humor em reflexões sobre nosso papel no mundo e sobre a sociedade que nos tornamos.

Quem são “essas pessoas” a quem responsabilizamos por tempos de ódio e decadência de valores?

 

“As pessoas são egoístas”. “As pessoas não sabem votar”. “As pessoas são mal-educadas”. “As pessoas não colaboram”. As pessoas são sempre os outros, e uns outros indeterminados… Só que, na verdade, as pessoas somos nós. É esse tipo de reflexão proposta pelo espetáculo “AS PESSOAS”ganhador do Prêmio Artes Cênicas do Sesc Nacional, que terá temporada de 4 semanas no Teatro Glaucio Gill, às quartas-feiras, dias 01, 08, 15 e 22, sempre às 20h. O espetáculo foi convidado  para fazer apresentações e debates com docentes e discentes de diversos cursos, em 2024, pela Universidade de Coimbra.

No palco, as pessoas são uma só: a atriz, produtora e autora do texto Márcia Santos. Três em uma personagem chamada Zelma, que até podem ser várias pessoas, todas provocadoras. Com direção de Rogério Fanju, o monólogo aborda de maneira crítica e bem-humorada comportamentos contemporâneos que, em geral, são percebidos por nós na ação alheia. É um padrão coletivo analisar hábitos e condutas sociais a partir da observação do outro, não raro, julgando-o ou responsabilizando-o. “As pessoas não se enxergam”. Mas que abstração é essa que designamos “as pessoas”? Que entidade intangível e incorpórea é essa que chamamos de “as pessoas”?

É a personagem Zelma que joga luz sobre o modo como naturalizamos certos comportamentos, como reproduzimos padrões sociais de controle do outro e sobre a nossa imensa responsabilidade social na dinâmica de uma sociedade global – que vai da seletividade do lixo que produzimos até os conteúdos que compartilhamos em nossas redes virtuais ou reais, que disseminam e fortalecem discursos, narrativas e condutas. “Eu penso em nós, humanos. E me compadeço do diabo”, ironiza Zelma, ácida e certeira.

“AS PESSOAS” foi um dos 3 textos de Márcia a entrar em cartaz em 2022. Antes dele, com sucesso de público e de crítica, ela realizou duas dobradinhas como autora junto com Édio Nunes na direção: “Joãosinho e Laíla – Ratos e Urubus, Larguem Minha Fantasia”, que esteve em cartaz no Sesc Arena Copacabana e retorna à cena em novembro, no palco do Teatro Dulcina, e “Luíza Mahin – Eu Ainda Continuo Aqui”, que estreou em 2021, foi contemplado com os prêmios de Melhor Espetáculo e Melhor Atriz (Márcia Santos) no Festival Nacional de Teatro de Varginha (MG), e segue carreira em 2022, atualmente circulando pelo SESI-SP, e com três indicações para o Prêmio Cenym de Teatro 2022 nas categorias Melhor Elenco, Melhor Qualidade Artística de Produção e Melhor Atriz (Cyda Moreno).

São peças ricas em questionamentos – subliminares ou não –, já que Márcia não perde uma chance para cutucar o público: “Como alcançar igualdade num mundo onde ninguém quer limpar a própria privada?”, indaga Zelma.

“AS PESSOAS” trata das pequenas ferocidades presentes em atos triviais do dia a dia. E, ainda que não seja possível controlar completamente a percepção e a reação do público, a montagem tenta se colocar na contramão da ideia de que o espectador seja apenas voyeur ou que se preserva intacto tal como entrou no teatro. Ao contrário, o que o texto propõe é o incômodo. Confronta o público com questões pontuais que permeiam nosso cotidiano e que denunciam diversos hábitos e condutas que passaram a ser naturalizados e que, muitas vezes, são responsáveis por inúmeros desgastes e esgarçamentos nas relações sociais.

“Propomos um teatro que, além de entretenimento, seja um provocador e inquietante estímulo à reflexão”, sinaliza Márcia Santos, que se inspirou nas relações pessoais de seu dia a dia. Relações que, muitas vezes, se vêm reproduzidas em mídias e jornais diários, chamando a atenção para como a sociedade, em seu radicalismo de pequenas guerras diárias, também pode levar à destruição. Sim, o texto de Márcia Santos também tem um caráter político.

Ela coloca a personagem entre livros e caixas, enquanto se empenha na construção de um “bunker” para se proteger do mundo lá fora. As caixas também setorizam fatos e ideias colocados pela personagem. O cenário é o esqueleto dos pensamentos dessa personagem, num eterno movimento de construção e desconstrução em simbiose com o plano de suas ideias. Em uma janela, ao fundo, rostos observam Zelma, representando todas as formas de comportamento invasivo percebidas pela personagem.

Entretenimento e reflexão. Como disse o dramaturgo e diretor francês Antonin Artaud, “uma verdadeira peça de teatro deve perturbar o repouso dos sentidos”.

 SINOPSE

“AS PESSOAS” é o desabafo de Zelma, mulher instruída e cansada, que se sente inadequada, descrente e sozinha em sua forma de perceber o mundo.

Em cena, Zelma movimenta caixas e livros, talvez na tentativa de construir uma muralha simbólica, que a separe e a proteja do mundo lá fora, já que o que ela deseja, é se esconder.

FICHA TÉCNICA

Texto, atuação e produção: Márcia Santos

Direção: Rogério Fanju

Iluminação: Paulo César Medeiros

Cenografia: Daniel Leão

Música Original e Direção Musical: Marcelo Alonso Neves

Figurino: Wanderley Gomes

Preparação vocal: Jorge Maia

Preparação corporal: Édio Nunes

Design gráfico e arte da janela cenográfica: Rômulo Medeiros

Fotografias: Cláudia Ribeiro

Operador de Luz: Rafael Tutti e Wladimir Alves Fernandes

Operador de Som: Felipe Coquito

 Sobre Márcia Santos

Atriz, produtora, autora, diretora teatral e cientista política formada pela Unirio, onde também se graduou em Artes Cênicas/Interpretação. Mestra em Sociologia Política pelo IUPERJ/Cândido Mendes.

Profissional multidisciplinar, com atuação nas áreas cultural, política e acadêmica. Recentemente esteve em cartas no espetáculo O Menino é Pai do Homem, com direção de Moacir Chaves, que inaugurou o projeto Nave de Luz, do iluminador Paulo Cesar Medeiros. Seu monólogo “As Pessoas”, contemplado com o Prêmio Sesc Artes Cênicas, foi o terceiro texto de sua autoria montado em 2022. Antes dele, com sucesso de público e de crítica, Márcia realizou duas dobradinhas como autora junto com Édio Nunes na direção: “Joãosinho e Laíla – Ratos e Urubus, Larguem Minha Fantasia”, que esteve em cartaz no Sesc Arena Copacabana e retorna à cena em novembro, no palco do Teatro Dulcina, e “Luíza Mahin – Eu Ainda Continuo Aqui”, que estreou em 2021, foi contemplado com os prêmios de Melhor Espetáculo e Melhor Atriz (Márcia Santos) no Festival Nacional de Teatro de Varginha (MG), e segue carreira em 2022, atualmente circulando pelo SESI-SP, e com três indicações para o Prêmio Cenym de Teatro 2022 nas categorias Melhor Elenco, Melhor Qualidade Artística de Produção e Melhor Atriz (Cyda Moreno).

Também em 2022, Márcia Santos atuou como atriz no clipe musical CORAGEM (https://youtu.be/tRYMr_UwFL0); participou do curta-metragem “Toró”, de Clara Ferrer e Marcela De Finnis, ainda em fase de finalização, e participa da série “Cinema de enredo”, dirigida por Luiz Antonio Pilar, para o Prime Box Brazil, gravada em 2019, mas que foi lançada no último mês de outubro no Festival de Cinema do Rio.

Em 2021, Márcia Santos foi contemplada com o Prêmio Funarj com o curta “Vamos fazer uma faxina”, de Joaquim Vicente (https://www.youtube.com/watch?v=y-ehA6FXQVE) e, em 2020, com Prêmio Funarte com o vídeo “Colhe o dia” (https://www.youtube.com/watch?v=nNykAWYsOus).

Em 2011, assinou roteiro e direção de “Brasil 70 – musical”, que estreou no Teatro Café Pequeno. E, em 2013, apresentou-se no Cassino Estoril, em Portugal, a convite da Embaixada do Brasil em Lisboa, e sob o patrocínio do OI Futuro, cumprindo temporada nova no Rio de Janeiro e circulação pelo interior do estado.

Serviço

“As Pessoas”

Temporada: Dias 01, 08, 15 e 22 de novembro (quartas-feiras)

Sessões: Sempre às 20h

Local: Teatro Glaucio Gill

Endereço: Praça Cardeal Arcoverde, s/n – Copacabana

Ingressos: 40,00 inteira/ 20,00 meia

Classificação: 14 anos

Duração: 65 minutos

Capacidade: 100 lugares