OPINIÃO

Por Sérgio Mesquita

 

O presente texto é voltado para as companheiras e companheiros do Instituto de Ciência, Tecnologia e Inovação de Maricá – ICTIM, em especial para aqueles e aquelas que trabalham nas três Incubadoras de Inovação Social (em Cultura; Robótica e Sustentabilidade; Tecnologias). Mas vale para o mundo também e compartilharei este texto entre os grupos que participo.

Trata-se de textos retirados do capítulo 12 do livro “Novos Renascimentos: Impactos da Tecnologia na Transformação Completa da Sociedade”, do Prof. Dr. Antônio M. Alberti, do Instituto Nacional de Tecnologia – INATEL, localizado na cidade de Santa Rita do Sapucaí-MG, berço do Vale da Eletrônica Brasileiro. Cidade que também sedia o “HackTown”, que acontece este ano (23), em agosto.

Alberti além de pintor, escultor, músico etc., desenvolveu, entre outras estripulias, uma Internet independente, e faz parte do grupo no Brasil que estuda o 6G, representando o INATEL.

Seu livro pode ser dividido em duas partes: uma mais técnica, porém escrita de maneira para que pessoas “leigas” em TI possam ter ideia do que está sendo exposto. Como por exemplo: tomar ciência que tem maluco estudando programação a partir de mudança da propriedade do “spin”, nos átomos. Loucura, mas houve um tempo em que a Igreja empastelou o laboratório que permitiu a primeira transmissão de rádio do Mundo, realizada pelo padre Roberto Landell em São Paulo, no ano de 1890. Padre Landell disse que poderíamos nos comunicar com pessoas mortas… deu ruim. Em sua segunda parte, a coisa é mais intrigante e puxa pelo cérebro. Filosofia pura onde se discute as possibilidades futuras das aplicações tecnológicas e suas possíveis consequências, todas, por enquanto, ainda de nossas responsabilidades, até que surja a máquina consciente. Discussão também presente no livro.

Vamos ao que acho interessante dividir com o povo das Incubadoras Sociais, que já trabalham bem próximo ao que será exposto aqui.

O capítulo 12, “Novos Renascimentos”, apresenta algumas questões que o autor deixa claro não ter as respostas, mas sim um caminho que poderá ou deveria ser seguido. São três as questões selecionadas: Por que precisamos empreender a mudança? Por que devemos trabalhar o lado humano? Existe empreendedorismo para melhorar o mundo? E uma quarta que é geral, e acho importante colocá-la: A solução é impedir o avanço tecnológico? Vamos aos textos.

Por que precisamos empreender a mudança?

Porque a pandemia de COVID-19 não é o maior desafio que tivemos neste século. Temos que dar o bom exemplo para as IAGs [Inteligência Artificial Generativa]. O mundo está lotado de maus exemplos! Temos problemas importantes de longa data: sustentabilidade, poluição, impactos ambientais, desemprego, crise de relevância, doenças, pandemias, armas químicas, armas biológicas, violência, criminalidade, corrupção, guerras. Como discuti antes, nem precisamos de um levantar das superinteligências para o caos. O mero uso de exército de IAs sem preocupação social e em modelos movidos somente por interesses, sem considerar princípios, já pode ser suficiente para fomentar distopias e cenários apocalípticos. O uso de armas químicas e biológicas. Novas pandemias. Aprisionamento e a perda da liberdade pelo aprisionamento e as distopias tecnológicas. Distopias de todo o tipo. Dominação e manipulação pelos metaversos, monitoramento do físico, proibições, novas roupagens para os modelos velhos.

Por que devemos trabalhar o lado humano?

Creio que os exemplos dados neste livro, ou seja, os desafios e responsabilidades que vêm junto com o empoderamento tecnológico já deixaram que a solução, assim como o problema está no humano em si. Mesmo com o advento das IAGs, são humanos que as irão educar, inspirar e motivar. Pelo menos em um primeiro momento. É claro que no futuro podemos ter IAGs autônomas e conscientes que ajam por conta própria. Mas, até lá são os humanos que devem dar o bom exemplo. Acredito que a liderança criativa, cuidadosa, detalhista, visionária, sistêmica, ética, justa, empática, transparente, livre, amorosa e feliz deve dar o exemplo e puxar a transformação. Só assim os demais seguirão. Temos que oportunizar e emponderar essas lideranças. Formar e torcer para que elas emerjam em todas as cidades de mundo afora.

Existe empreendedorismo para melhorar o mundo?

O empreendedorismo em rede (com suporte de tecnologia, sem cargos, horizontal, cogerido, sistêmico, equilibrado e liderado de forma criativa e situacional) parece ser um dos caminhos. Um empreendedorismo baseado em princípios (e valores) e não puramente em interesse, onde os fins justificam os meios. Um empreendedorismo transparente, onde a máxima “faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço” saia de cena. Precisamos viabilizar novos modelos de empreendedorismo. Torná-lo próspero em múltiplas dimensões, inclusive a financeira.

É óbvio que o empreendedor que comprar essa ideia enfrentará todo o tipo de problema e concorrência desleal. Terá que ser próspero financeiramente, mesmo com todas as implicações de executar essa mentalidade e novos modelos. O desafio é enorme. O ganho é comprovar que é possível fazer diferente. Liderar, por exemplo. Tornar-se referência em termos de modelo, mentalidade, cultura e justiça organizacional. A meu ver, implantar uma organização com essas características, de fato (e não só no marketing) vai atrair todos aqueles interessados no trabalho do futuro. Em criar futuros de valor. Vai atrair aqueles que desejam prosperidade, em uma organização que os cure dos traumas dos modelos ultrapassados.

Sempre existe um gap entre o que desejamos e o que de fato fazemos. Podemos desejar a utopia, mas na prática empoderar a distopia, o autocrático, o escasso, o não sistêmico, o desiquilibrado o injusto e até mesmo o antiético. O ser humano é naturalmente dual e limitado. Por mais que desejamos mudança, estamos fadados a recaídas o tempo todo em modelos ultrapassados. Não é nada trivial refazer as conexões neurais para novos modelos e mentalidades. Mesmo que se deseje muito, mudar para o melhor pode ser um esforço fenomenal e lento. Muito, mas muito, mais lento do que o avanço exponencial de nossas tecnologias e seus empoderamentos. Esse gap é o que ameaça a humanidade hoje.

A solução é impedir o avanço tecnológico?

Em um mundo altamente tecnológico, todos são empoderados exponencialmente. Basta alguns mal-intencionados resolverem usar tecnologias extremamente poderosas para o mal e teremos o caos ou a infelicidade total. A solução é impedir o avanço tecnológico? Certamente, não. A história está cheia de exemplos de que isso não funciona. O importante é avançar na conscientização, novos modelos organizacionais e mentalidades positivas, que favoreçam a utopia e não o caos.
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Encerro aqui, mas ponho, quem sabe um gosto doce ou amargo em nossas bocas, pois como exposto no livro, depende somente de nós. O livro apresenta várias outras discussões, inclusive da possibilidade de novas espiritualidades e divindades a partir das IAGs e do metaverso… Se liga na encrenca.

Outro ponto tocado no livro, está na importância da aplicação das Leis Sistêmicas, por todos e todas. São somente três “artigos”, mas mexem com o nosso universo na busca do equilíbrio. Segundo Edgar O. Wilson, “O verdadeiro problema da humanidade é o seguinte: temos emoções paleolíticas, instituições medievais e tecnologia divina”. São elas:

1 – Ordem
Diz respeito à ordem das coisas, à história, ao respeito e a honra ao que já foi feito, a precedência das ações dos atores, ao posicionamento temporal nos sistemas (…). Desonrar a ordem pode levar ao desequilíbrio sistêmico (…).

2 – Pertencimento
Trata-se do direito de pertencer. Pertencer a algo é uma necessidade básica. Todos pertencem aos mais diversos coletivos: famílias, empresas, escolas, bairro, grupos sociais etc. (…). Não devemos excluir as pessoas nos processos, coletivos e qualquer grupo. Este é um dos maiores desafios da cocriação criativa, da gestão compartilhada, das economias leves, dos novos modelos organizacionais, do empreendedorismo criativo em rede (…).

3- Equilíbrio do Dar e Receber: Reciprocidade
Em todos os relacionamentos estamos sempre dando e recebendo. Sejam carinhos, sejam valores financeiros, sejam entregas, sejam o que for. O desequilíbrio do dar e receber desgasta os relacionamentos (…).

(…) O desequilíbrio sistêmico é ruim para todo o coletivo. As Constelações Sistêmicas são dinâmicas de grupo que buscam resgatar o equilíbrio (…). Max Nolan Shen [79] argumenta que quanto mais equilibrado for um coletivo mais felizes as pessoas serão. E mais, que toda a comunicação deve respeitar as Leis. Ou seja, não deve desrespeitar a ordem, o pertencimento e a reciprocidade. É a chamada Comunicação Afetiva (…).

Há braços.

Sérgio Mesquita
Subsecretário de C&T da Secretaria de Educação de Maricá-RJ

 

“A Tecnologia como ferramenta de resgate de nossas humanidades” Mantra da Sec. de Ciência, Tecnologia e Comunicações de Maricá (2017-2020)