No dia 3/3, aconteceu a atividade que marcou a Greve Global pelo Clima na região da Leopoldina, com o intuito de despertar a consciência para a emergência da reflexão sobre as mudanças climáticas e os seus impactos sobre as populações que moram em territórios socialmente vulnerabilizados.    O ato teve início na quadra da Escola de Samba Unidos do Jacarezinho. Dali,  trabalhadores e estudantes da Fiocruz, lideranças comunitárias, parlamentares e movimentos sociais deram início a caminhada, passando pelos rios Jacaré e Faria-Timbó, adentrando os becos e vielas das favelas para verificar as áreas mais atingidas pelas enchentes e  ouvir os relatos dos moradores. A atividade terminou na Estação de Trem de Manguinhos com o pronunciamento de vários ativistas e com a formação de uma grande círculo humano, todos de mãos dadas, simbolizando a união e a luta pela proteção do planeta Terra e contra o racismo ambiental.

A iniciativa foi organizada por várias entidades, como Coalizão pelo Clima RJ, Fórum de Mudanças Climáticas e Justiça Socioambiental (FMCJS), a Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase), Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes), Sindicato dos Trabalhadores da Fiocruz (Asfoc), Rede Favela Sustentável, Rede de Vigilância Popular em Saneamento e Saúde, Conselho Gestor Intersetorial de Manguinhos (CGI), Conselho Comunitário de Manguinhos, Organização Mulheres de Atitude (OMA), Associação de Moradores Samora Machel, Associação de Moradores Nelson Mandela, Associação de Moradores Parque Carlos Chagas e Associação dos Moradores da Nova Embratel. O ato ainda contou com o apoio de diversos movimentos sociais, lideranças comunitárias e parlamentares.

De acordo com a pesquisadora do Departamento de Saneamento e Saúde Ambiental (DSSA/ENSP/Fiocruz), Maria José Sales, foi essencial a Greve Global pelo Clima acontecer nos territórios em que as pessoas foram mais afetadas pelos efeitos ocasionados pelas enchentes. “Vimos in loco pessoas morando abaixo do nível da rua, condições péssimas de moradia, os becos, a falta de água, o esgoto in natura jogado nas ruas e os rios transbordando depois da chuva: situação caótica”. Para ela, é importante o trabalho que a Fiocruz realiza nesses territórios.  É papel das instituições de pesquisa  empregarem mais recursos, como tecnologia, ciência, estudo para colaborar com essas pessoas que enfrentam as piores condições de vida, acarretando de forma objetiva alterações em todos os aspectos da saúde dessas populações.

Para a pesquisadora do Departamento de Saneamento de Saúde Ambiental da ENSP/Fiocruz e Coordenadora do Projeto da Rede de Vigilância Popular em Saneamento e Saúde, Adriana Sotero Martins, o evento teve grande impacto e participação das comunidades. Moradores contaram aos integrantes do ato que tiveram a água contaminada, vestimentas perdidas e a casa toda alagada, com grande probabilidade de causar várias doenças, como a leptospirose, além  do risco de morte que enfrentam. “Agora, precisamos nos mobilizar para dar respostas às comunidades na elaboração de um Plano de Vigilância Popular e de Contingência nas Favelas diante de eventos climáticos extremos”, afirmou. Para ela, foi fundamental a participação dos trabalhadores e alunos da Fiocruz, que devem, com os movimentos sociais, cobrar por efetividade na Política Municipal sobre Mudança do Clima e Desenvolvimento Sustentável. “Nós, da Rede de Vigilância Popular em Saneamento e Saúde, estamos engajados nessa luta”, assegurou.

Moradora de Jacarezinho, Carmen Camerino, destacando a falta de dragagem no rio Jacaré. Foto: Joyce Enzler

A Carta-manifesto sobre os desastres climáticos no Rio de Janeiro foi entregue aos moradores de Jacarezinho e Manguinhos. Além disso, várias lideranças da região mostraram os efeitos causados pela chuva, a falta de saneamento básico e de dragagem dos rios  e reivindicaram mais políticas públicas para o território. Carmen Camerino, assistente social e moradora do Jacarezinho, percebe esse abandono como uma prática racista: “Todos nós sabemos que as favelas sempre foram deixadas às margens da cobertura das políticas sociais e públicas, dos direitos sociais preconizados na nossa Constituição Federal”. Para Carmen, o acesso à Educação, à Saúde,  à moradia de qualidade, ao trabalho digno,  ao saneamento básico nunca aconteceram, assim como a questão das enchentes nunca foram resolvidas.

Moradora de Manguinhos, Jéssica Lene, mostrando aos pesquisadores da Fiocruz e aos parlamentares a Rua São José, local mais atingido pela enchente. Foto: Joyce Enzler

Segundo a moradora de Manguinhos e estudante de Pedagogia da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio), Jéssica Lene, as favelas não possuem uma boa drenagem dos rios, os esgotos nas favelas vivem sempre entupidos e a coleta de lixo não é feita de forma diária. “Então, aumenta o impacto no território quando chove, destruindo os eletrodomésticos e as casas das pessoas”. Segundo Lene,  essas mobilizações são importantes porque trazem visibilidade a essa população vulnerabilizada, que há um mês perdeu tudo: seus bens materiais, alimentação. Ela  mostrou aos pesquisadores da Fiocruz e aos parlamentares a situação da Rua São José após a enchente. A água, ali, chegou a atingir dois metros de altura. Para Jessica, a Greve Global pelo Clima também foi relevante, pois é necessário chamar a atenção da opinião pública e, principalmente,  o engajamento dos moradores destas áreas.


Leia a Carta-manifesto do ato da Greve Global pelo Clima

Leia também a entrevista com a ativista e pesquisadora Rita Passos