TEATRO

Por Alessandra Costa

 

O novo trabalho do grupo carioca traz personagens históricos ligados à Bossa Nova, encenados por atrizes e atores negros; o enredo retoma (ficcionalmente) biografias e memórias do movimento musical carioca, na emergência de um Rio de Janeiro das décadas de 1950 e 1960

 

Chega de Saudade! é o mais recente espetáculo da Aquela Cia, com direção de Marco André Nunes e texto de Pedro Kosovski. Neste novo trabalho, o grupo retoma (ficcionalmente) personagens, biografias e memórias da Bossa Nova, na emergência de um Rio de Janeiro do “amor, do sorriso e da flor”, dos anos 1950 e 1960, em uma versão somente com atrizes e atores negros. No elenco estão Blackyva, Felipe Oládélè, Hugo Germano, Izac da Hora, Jessica Barbosa, Muato e Polly Marinho. A peça estreia no Rio de Janeiro, no Sesc Copacabana, após realizar temporada de sucesso em São Paulo, no Sesc Consolação.

As canções-ícone do movimento conduzem a narrativa compondo um fluxo emocional que evoca e, ao mesmo tempo, atualiza o movimento musical, fazendo um paralelo entre o Rio de Janeiro cantado naquelas canções idílicas e como de fato é a cidade, na visão de um grupo de artistas com perspectivas distintas, aspirações e inspirações.

Re(des)montando a bossa nova

O movimento criado nos anos 1950 por jovens brancos e de boas condições financeiras – que falavam de temas banais como o amor e tinham como cenário as praias do Rio de Janeiro – trouxe inovação à música brasileira e criou novas formas de batidas de violão e de harmonia. Na versão da Aquela Cia, personagens históricos como João Gilberto, Roberto Menescal, Sylvia Telles, Nara Leão e Carlos Lyra ganham versões encenadas por atores e atrizes negros. Ao mesmo tempo que, do seu modo, o coletivo presta uma homenagem à Bossa Nova já em seu título, o ponto de exclamação anuncia para onde caminha o espetáculo.

O espetáculo se inicia com a recriação ficcional de um sarau no apartamento da jovem Nara Leão. Na segunda parte, os personagens/ intérpretes se questionam como aqueles jovens dos anos 1950 veriam este futuro, tão distante do sonho de Brasil que eles cantaram. Na terceira parte, personagens, atrizes, atores, fantasmas e seres vivos em uma descida ao inferno onde se faz escutar o grito: Chega! Chega de saudade! Seria possível sustentar algum lirismo em tempos como os nossos?

Chega de Saudade! dá continuidade a interface com a linguagem audiovisual iniciada em sua peça-filme, lançando mão de projeções tanto de transmissões ao-vivo da peça quanto de materiais de arquivo como fotografias e matérias de jornais que mostram a construção da cena cultural e estética daquela nação, hoje um tanto distante devido aos traumas políticos, raciais e sociais.

Sinopse 

Uma fábula da bossa nova: a emergência de um Rio de Janeiro do “amor, do sorriso e da flor”, no final dos anos 50, início dos anos 60, em uma versão dissonante performada por atrizes e atores negros que criaram, colaborativamente, ao longo dos anos pandêmicos de 2020/21/22 esta obra. As canções-ícone do movimento são ressignificadas compondo um fluxo emocional que evoca, atualiza e transgride afetos “bossa-nova”. O uso da fotografia e de materiais de arquivo apontam para a construção histórica de uma sensibilidade cultural e estética de uma nação supostamente inventiva, “cordial” e cosmopolita, hoje, explicitamente marcada por violências e traumas raciais, políticos e sociais. Esta obra é dividida em três partes, “Sorriso” “Flor” e “Amor”. Na primeira parte, uma reconstituição do célebre sarau no apartamento de uma jovem Nara Leão. Na segunda parte, artistas tentam realizar um documentário que busca ser uma canção de amor um tanto quanto amarga para ser ouvida hoje. Na parte final, personagens, atrizes, atores, fantasmas e seres vivos em uma descida ao inferno onde se faz escutar o grito: Chega! Chega de saudade! Seria possível sustentar algum lirismo em tempos como os nossos? Qualquer espécie de lirismo que rompa a mudez do horror?

Ficha técnica 

Elenco: Blackyva, Felipe Oládélè, Hugo Germano, Izak Dahora, Jessica Barbosa, Muato e Polly Marinho

Direção: Marco André Nune

Texto: Pedro Kosovski

Colaboração de texto e Interlocução: Rodrigo de Arruda

Narrações: Polly Marinho e Pedro Kosovski

Direção Musical: Felipe Storino

Cenário: Ciro Shu e Marco André Nunes

Figurino: Fernanda Garcia

Iluminação: Renato Machado

Bateristas: Thiago Kobe

Visagista: Diego Nardes

Preparação vocal: Pedro Lima

Operação de luz: Rommel Equer

Sistema de Vídeo: Júlio Parente

Operador de Vídeo: Igor Gouvêa

Direção de Movimento: Toni Rodrigues

Assistente de Direção e Operação de Câmera: Diego Ávila

Operação de som: Bob Reis

Designer gráfico: Igor Gouvêa

Fotografia: Ligia Jardim

Produção: Corpo Rastreado

Aquela Cia. 

Marco André Nunes e Pedro Kosovski fundaram em 2005 esse núcleo de realização em artes da cena sediado no Rio de Janeiro. Com ênfase em processos de criação coletiva e na elaboração de uma dramaturgia inédita atravessada pelos conceitos de memória coletiva, fabulação e imaginário social, dentre as suas obras mais recentes destaca-se a “Trilogia Carioca” formada por “Cara de Cavalo” (2012), “Caranguejo Overdrive” (2015), “Guanabara Canibal” (2017). Em 2023, está prevista a estreia da inédita “Terra Desce”.

Serviço 

Temporada de 09 de março à 02 de abril (quinta a domingo)

20:30 hrs no Mezanino do Sesc Copacabana

Lotação: 60 lugares

Duração: 90 minutos

Ingressos: R$ 7,50 (associado do Sesc), R$ 15 (meia-entrada), R$ 30 (inteira)

Endereço: Rua Domingos Ferreira, 160, Copacabana, Rio de Janeiro – RJ

Informações: (21) 2547-0156

Horário de funcionamento da bilheteria: de terça a sexta, das 9h às 20h; e sábados, domingos e feriados, das 13h às 20h