Os investidores de Wall Street acharam a mina de ouro. Em breve, poderão comprar terras públicas, o reino da Mãe Natureza, para se tornar proprietários delas e gerenciar esses bens comuns. Na verdade, um projeto piloto já está em andamento com ecossistemas sendo vendidos, enquanto a bolsa de valores se prepara, ansiosa, para devorar os valiosos frutos da Mãe Natureza.

De acordo com o Departamento de Relações Públicas da Bolsa de Valores de Nova Iorque (NYSE), eles irão fazer ofertas públicas de ações da natureza: “Para preservar e restaurar os bens naturais que ultimamente sustentam a vida na Terra.” O quê? É isso mesmo?

E segundo Michael Blaugrund, diretor de operações da NYSE : “Nossa esperança é que tornar-se proprietário de uma companhia de bens naturais seja uma forma de um número cada vez maior de investidores aplicarem dinheiro em algo com valor intrínseco, mas que, até o momento, fora excluído do mercado financeiro.”

Isso significa que o capitalismo neoliberal está se tornando o protetor beneficente da natureza? Ou que os ambientalistas podem parar de se angustiar com os fenômenos que, nas últimas décadas, têm ecoado o som gutural da extinção eminente, como por exemplo, as horrendas perdas de vida selvagem — um decréscimo de incríveis 68% —, as perdas de pantanais e de enormes áreas de florestas tropicais? Resposta: Não conte com isso.

Para início de conversa, há algo muito repugnante e asqueroso a respeito da compra das capacidades de recursos da natureza pelos investidores de Wall Street.  Essa compra sinaliza um mundo de cabeça para baixo, onde o ridículo se torna aceitável. Podemos mesmo aceitar essa situação? Podemos?

O personagem principal nessa nova trama para dominar o mundo é um novo tipo de bem com um nome muito simples, que diz tudo: empresa de ativos naturais ou NAC . Sim, se você é um bilionário, prepare-se para comprar até 30% dos recursos naturais do planeta. A oferta será feita no maior leilão do mundo, a Bolsa de Valores de Nova Iorque, sob o disfarce da busca pela sustentabilidade e pela proteção da biodiversidade (se você não contar, eu também não conto).

É claro que isso traz alertas para uma série de questões, sendo a principal delas a seguinte: quando que a Mãe Natureza virou um pedágio?

Em termos mais simples, as NAC permitem a formação de corporações especializadas, que detêm os direitos do que o ecossistema de uma determinada área pode oferecer, como a captura de carbono, a água limpa, o ar rarefeito de uma montanha no Tibete ou talvez um lago cheio de trutas. As possibilidades são infinitas quando se está leiloando importantes áreas de um bem tão grande como o planeta.

A NAC vai manter, gerenciar e cultivar o bem natural que ela transformou em commodity, trabalhando para maximizar o lucro potencial desse bem, ainda que, obviamente, essa parte não tenha sido enfatizada no material de relações públicas. Ainda assim, esse cenário pode levar a lucros quase infinitos. Afinal, a Terra é um ser vivo que se rejuvenesce, se recupera e faz a manutenção dos ecossistemas em seus próprios termos, um processo natural e contínuo. Por que não tomar posse disso?

Se houve, em algum momento, uma ocasião para as pessoas do mundo largarem o que quer que estejam fazendo e focarem em uma questão, este momento é agora. Os bens naturais estão à venda! Pense com seriedade sobre essa proposta, estude-a, discuta-a e decida se é certo concordar com a monetização da Mãe Natureza. Se não houver um consenso, então faça alguma coisa: conte às pessoas, conte a qualquer um que vá te escutar, carregue cartazes nas ruas, junte-se a uma manifestação, bata panelas em casa. Faça alguma coisa para aliviar a pressão vertiginosa que está se formando sobre nossos templos!

O Intrinsic Exchange Group, em parceria com a NYSE, está trabalhando, com o governo da Costa Rica, em um projeto piloto de NACs para instituir, no país, o protocolo de posse de florestas, lagos, cachoeiras, montanhas, prados, cavernas e pantanais — em suma, de toda a natureza. A Costa Rica está cedendo terreno para a venda de ecossistemas Mãe Natureza, quer a mãe natureza queira ou não.

De início, a NAC identifica um bem natural, como uma floresta, que é quantificado usando protocolos especiais que já foram desenvolvidos por várias coalizações em conjunto com corporações multinacionais, o que, por si só, já é sinistro. Em seguida, decide quem tem os direitos à produtividade do bem natural e como ele deve ser gerenciado. Então, a área é monetizada por meio de uma oferta pública inicial na bolsa de valores. Desse modo, a NAC se torna “o emissor” para potenciais compradores do bem natural representado por ela. O que, no fundo, é como ser o corretor imobiliário da Mãe Natureza. Os compradores são investidores institucionais, ou um ou outro bilionário, que querem ter os direitos dos benefícios de pantanais, florestas tropicais, fontes de água naturais, ar rarefeito das montanhas, fontes termais ou qualquer outra coisa que desejarem. Para eles, o mundo é uma ostra que está à venda para ser comprada, usada e assim gerar lucros.

Ao longo de toda a história dos seres humanos, a natureza tem sido o bem natural de toda a sociedade ou tem nos oferecido recursos culturais e naturais, inclusive de processos simples como ar e água. Mas, agora, investidores privados estão deletando esses bens, com alegações de estarem agindo em nome da “conservação e sustentabilidade” de 30% daquilo que é chamado de “áreas protegidas” dos nossos bens espalhados pelo mundo.

Com base nos cálculos iniciais, as NACs vão liberar quatro quadrilhões de dólares em bens, para que investidores de Wall Street, como predadores famintos, comprem os direitos à água potável, ar, corredeiras cheias de trutas, lagos cheios de robalos, maravilhosas cachoeiras e lagoas pitorescas, florestas inteiras ou, talvez, no futuro, aos oceanos. Não há como prever as possibilidades uma vez que a natureza for negociada em Wall Street.

Monetizar a natureza!

O que nos aguarda, o que nos resta?

Os bens naturais são propriedades compartilhadas por todos, incluindo produtos naturais como o ar, a água, um planeta habitável, as florestas, os pescados, os lençóis de água, os pantanais, os pastos, a atmosfera, os oceanos, a Antártida, o espaço sideral, as cavernas e todos os ecossistemas do planeta.

A triste verdade é que a Mãe Natureza Ltda. vai nos conduzir à extinção desses bens naturais, como uma instituição, no maior golpe de todos os tempos. É claro que a propriedade privada da natureza é indesejável e certamente demanda uma questão bem maior e mais relevante e que vá ao cerne do assunto, isto é: Os ecossistemas, que beneficiam toda a sociedade, deveriam ser monetizados para o benefício direto de uma minoria?


Traduzido do inglês por Felipe Balduino | Revisado por Doralice Silva