Resenha de livro: Five Myths About Nuclear Weapons (literalmente, “Cinco Mitos sobre Armas Nucleares”)

Talvez isso já tenha acontecido a você…

Você é um ativista e um idealista, e investiu muito tempo em promover ideias de desarmamento nuclear porque você quer viver sem a insegurança que faz com que se preocupe com o futuro. Um dia, você se encontra em um jantar com a família ou com amigos e acaba caindo no tema pelo qual é passional: armas nucleares.

Você fala sobre a manifestação à qual participou ou sobre a conferencia que frequentou. Você é bastante entusiástico e dá todos os vários bons motivos para que essas armas sejam banidas: o impacto nos civis, o impacto no meio-ambiente, o envenenamento por radiação, etc, etc.

Todos os seus amigos e os membros da sua família concordam e te apoiam, mesmo que não tenham muito tempo de se envolver: todos exceto uma pessoa. Há sempre uma pessoa que é cética e até absolutamente negativa em relação a você, e quando você termina de falar ardentemente, essa pessoa diz: “Mas, sem as armas nucleares, o Japão não teria se rendido na Segunda Guerra Mundial”. Ou eles dizem: “Precisamos de uma dissuasão para impedir que outros países nos ataquem”. Ou até mesmo: “as armas nucleares tem mantido a paz na Europa desde 1945”.

E assim, eles te deixam perplexo, porque tudo o que você aprendeu na escola te diz que eles estão certos. Você odeia as armas nucleares e quer que elas sejam coisa do passado, porque você é um idealista e não deveria haver guerra ou violência, fome ou qualquer tipo de sofrimento que a ciência e a tecnologia possam aliviar.

Então você diz, de uma forma envergonhada: “É, bem, o mundo não deveria ser assim, porque se não tivermos cuidado, algum idiota vai lançar uma bomba, ou elas serão um acidente e vão matar a todos nós”. E isso é verdade, mas não vence a discussão porque, secretamente, você sabe que esse amigo ou parente “pé no saco” está certo.

Bem, não se preocupe mais, porque há um livro que vai mudar a sua vida!

“Five Myths About Nuclear Weapons” é um livro brilhante escrito por Ward Wilson que vai mudar a sua experiência em jantares e reuniões de família PARA SEMPRE. Você será capaz de manter sua cabeça erguida como um ativista anti-nuclear e responder a todos os pontos mencionados acima sem precisar de um diploma em história ou política. E basta apenas revisar e reaprender tudo o que fomos ensinados sobre as armas nucleares, porque o tema todo foi envolvido em fantasia e mitologia. Parece que o truísmo “a história é escrita pelos vencedores” está correto, mesmo nas guerras do século XX.

Wilson responde em pouco menos de 100 páginas aos seguintes mitos:

• O Japão foi forçado a sair da Segunda Guerra por causa das bombas em Hiroshima e Nagasaki;
• As bombas de hoje são milhares de vezes maiores do que aquelas duas primeiras;
• A política de dissuasão nuclear funciona;
• As armas nucleares tem mantido a paz pelos últimos 67 anos;
• Não há alternativa às armas nucleares.

Não quero ir muito à fundo nas respostas a todos os mitos que Wilson expõe no livro, porque se você é um ativista, deve realmente comprar um exemplar e lê-lo. Tenho certeza de que esse livro não vai transformar Ward num homem rico, porque é provável que ele só seja lido por ativistas e esperamos que por um número cada vez maior de estudantes de armas nucleares e política internacional, portanto ao invés de dar todas as respostas aqui, eu te incentivo a comprá-lo.

Mas vou entrar no primeiro mito: o de que o Japão saiu da Segunda Guerra por causa da bomba nuclear, porque parece que há uma razão muito mais provável pela qual o Japão teria deixado a guerra.

Claro que, para qualquer um de nós, imaginar uma bomba como a de Hiroshima caindo sobre nossa cidade seria motivo suficiente para se render, então é fácil aceitar essa ideia e todas as verdades sobre armas nucleares aceitas subsequentemente, mas o autor nos leva de volta a agosto de 1945 e revela a situação do Japão naquele momento. Aqui está um resumo dela.

  • No período da guerra, o Japão tinha 78 cidades.
  • Mesmo que uma bomba nuclear seja devastadora, não é pior inicialmente do que dúzias de bombardeiros liberando suas bombas numa mesma noite, e isso já tinha acontecido em grande medida em outras 66 cidades antes de 6 de agosto. A maior parte não ficou tão destruída quanto Hiroshima, mas muitas ficaram, tanto em termos de área de superfície devastada quanto em número absoluto de mortes. Tóquio leva o prêmio com 120 mil mortos na noite de 10 de março de 1945 e algo em torno de 40 quilômetros quadrados destruídos.
  • Tendo já perdido 66 cidades, não seria grande coisa para os japoneses perder mais uma, mesmo que isso tenha se dado com apenas um avião e uma bomba.
  • Levou quatro dias para que o alto escalão japonês se reunisse e concordasse em se render. Eles já estavam nessa reunião quando as noticias sobre Nagasaki chegaram, portanto esse bombardeio não foi o motivo para ela. Que tipo de reunião de emergência é convocada depois de 4 dias? As notícias sobre a bomba de Hiroshima chegaram ao alto escalão em questão de horas. Por que a demora?
  • Wilson, de maneira bastante convincente, propõe que a razão pela qual eles estavam em uma reunião sobre rendição era porque, à meia-noite do dia anterior, a União Soviética havia entrado na guerra e enviado suas tropas para territórios ocupados por japoneses na China e esperava-se que chegassem às ilhas japonesas dentro de duas semanas.
  • O Japão não tinha chance de lutar uma guerra inesperada contra os norte-americanos de um lado e os soviéticos do outro. Eles não tinham escolha senão se render.
  • Convenientemente, eles poderiam colocar a culpa dessa rendição nas bombas nucleares, dizendo que foram forçados a sair por causa do desenvolvimento cientifico de uma bomba milagrosa pelos EUA, e não por causa de qualquer superioridade na capacidade militar, o que seria uma grande humilhação para ser aceita pelo alto comando japonês.
  • Essa explicação também convinha aos norte-americanos, que tinham investido 2 bilhões de dólares no desenvolvimento da bomba (em dólares americanos de 1940) e precisavam justificar o gasto.

Quando li esse livro, senti entusiasmo ao pensar que nunca mais seria humilhado no jantar!! Ele vira de cabeça para baixo tudo o que eu achava que sabia sobre o fim da guerra e, claro, as implicações que correm ao longo de toda a filosofia da dissuasão nuclear.

Ward, de uma forma bastante empenhada e objetiva, passa pelos outros mitos. Tudo é repleto de referências para acompanhamento, caso você duvide de qualquer um dos pontos, e ele trabalha os mitos como a sua mãe trabalha o peru de Natal: de forma limpa e eficiente.

Antes de escrever essa resenha, eu queria checar o que está sendo estudado na escola hoje em dia, porque eu não tinha certeza se talvez isso fosse chocante para mim por causa da educação da minha geração e podia ser que as coisas tinham mudado. Então, consultei o filho de um amigo meu de Londres, Matthew, de 13 anos, que me disse: “O fim da guerra aconteceu porque os EUA lançaram duas bombas nucleares em duas cidades matando mais de 130 mil pessoas e forçando o Japão a se render.”

Portanto, o mito está sendo reforçado e repetido de geração à geração. Não é de se admirar que seja tão difícil mudar para o desarmamento.

Esse livro é um tesouro para qualquer um remotamente interessado em desarmamento nuclear porque ele permite que você desperte da mitologia da dissuasão e entenda por que estamos onde estamos hoje.

Vou ser otimista e dizer que quando os políticos do mundo finalmente lerem este livro, isso vai causar uma mudança de paradigma no debate sobre desarmamento nuclear. O Tratado de Não-Proliferação vai poder avançar e um acordo para eliminar as armas nucleares será possível.

De fato, ele deverá deixar claramente isoladas as únicas pessoas que tem algum motivo para manter as armas nucleares onde estão: aqueles que fazem milhões de dólares com elas. É de se esperar, no entanto, que apesar desses parasitas que vivem do medo e da miséria humana, a maioria das nações e daqueles que desejam a paz no mundo será capaz de fazer valer sua vontade e nos ajudar a alcançar a abolição nuclear, não em um futuro tão distante quanto o Presidente Obama nos faz acreditar, mas nas próximas duas décadas.

Traduzido por Thayná Moreira