POVOS ORIGINÁRIOS

 

Passados quase cinco meses após a posse da ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajarara, o Brasil já apresenta alguns avanços nas políticas de proteção aos povos originários. Entre esses avanços podem ser citadas a demarcação de seis novas terras indígenas, algo que não ocorria desde 2018, a instituição do Comitê Gestor da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental em Terras Indígenas (PNGATI) e a recriação do Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI). Também estão em curso uma série de medidas de socorro aos yanomami, residentes no Norte do país.

O decreto de homologação do processo de demarcação de seis novas terras indígenas foi assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no final de abril e representa o último passo antes do registro formal. Estão sendo oficializados os territórios Uneiuxi, em Santa Isabel do Rio Negro e Japurá, no Amazonas; Arara do Rio Amônia, em Marechal Thaumaturgo, no Acre; Tremenbé da Barra do Mundaú, em Itapipoca, no Ceará; Kariri-Xocó, em Porto Real do Colégio e São Brás, em Alagoas; Avá-Canoeiro, em Minaçu e Colinas do Sul, em Goiás; e Rio dos Índios, em Vicente Dutra, Rio Grande do Sul. Juntas, essas áreas abrigam cerca de 3,7 mil indígenas.

Além disso, a Fundação dos Povos Indígenas (Funai), também comandada por uma mulher indígena, Joenia Wapichana, está trabalhando para homologar 14 outros processos de terras. Para ampliar a capacidade técnica do órgão e garantir a execução das políticas públicas de proteção aos povos originários, depois de anos de desmonte, já foi autorizada a realização de um concurso público para contratação de 502 novos servidores para a Funai.

Recriado após ser extinto em abril de 2019 pelo governo Bolsonaro, o CNPI fica responsável pela elaboração e pelo acompanhamento da implementação de políticas públicas destinadas aos povos indígenas, enquanto que o PNGATI tem como objetivo promover e garantir a proteção, a recuperação, a conservação e o uso sustentável dos recursos naturais nos territórios indígenas. Territórios como o do povo yanomami, em Roraima, que teve situação de emergência decretada em janeiro deste ano diante da grave crise de desassistência sanitária e nutricional na região.

A criação do Ministério dos Povos Originários foi uma promessa de campanha do presidente Lula e é o primeiro, em toda a história do país, dedicado exclusivamente às demandas dos indígenas. Além disso, Sonia Guajajara, eleita deputada federal em 2022, nascida e criada na terra Arariboia, no Maranhão, é a primeira ministra indígena do Brasil. Da mesma forma, a advogada Joenia Wapichana, pertencente à comunidade Truarú da Cabeceira, em Roraima, é a primeira indígena a presidir a Funai em mais de cinco décadas de existência do órgão federal.

Segundo a ministra Sonia Guajajara, nesse primeiro momento, grande parte das ações e recursos do Ministério dos Povos Originários está sendo destinada ao enfrentamento à crise humanitária do povo yanomami, vítima do avanço do garimpo ilegal. Em audiência pública no Senado Federal, realizada no dia 10 de maio, a ministra disse que a ação integrada envolvendo oito ministérios tem gerado ações efetivas e urgentes, como a instalação do Centro de Operação de Emergência em Saúde Pública e de um comitê nacional com a articulação de uma estrutura física e logística.

Entre os resultados alcançados no combate ao garimpo ilegal na região, pode ser citada a desmobilização de 330 acampamentos e dois portos de apoio logístico, envolvendo mais de 40 prisões, bloqueio de recursos e a inutilização de dezenas de balsas, aeronaves e embarcações. Até agora, cerca de 80% dos invasores já teriam deixado a região. Como medida de longo prazo, está sendo planejada a fixação de bases permanentes de fiscalização para evitar o retorno de garimpeiros nessa e em outras áreas indígenas, pois operações semelhantes de desintrusão também estão ocorrendo em territórios como o Uru-Eu-Wau-Wau e Karipuna, em Rondônia.

Yanomamis

Os yanomami são cerca de 33 mil espalhados em mais de 600 comunidades entre o Brasil e a Venezuela. Imagens de crianças e idosos em estado de desnutrição aguda correram o mundo no início de janeiro deste ano. Mais de mil indígenas, muitos também apresentando quadros graves de malária, precisaram ser deslocados às pressas para postos de saúde para receber cuidados. Tais problemas de saúde estão diretamente relacionados ao crescimento do garimpo ilegal em suas terras, prática que polui rios, contamina peixes e provoca doenças.

Não é de hoje que esse povo, que teve o processo de demarcação concluído em 1992, sofre com a presença do garimpo ilegal. Ainda na década de 1990, um ataque de garimpeiros que resultou na morte de 16 indígenas ficou conhecido como massacre do Haximu. O problema, porém, vem se agravando nos últimos anos. Um estudo conduzido pela Hutukara Associação Yanomami apontou o crescimento de 309% no desmatamento associado ao garimpo entre outubro de 2018 e dezembro de 2022.

O Supremo Tribunal Federal (STF) determinou a apuração de crimes, entre eles o de genocídio, contra autoridades do governo Bolsonaro. A omissão do governo anterior em relação aos impactos do garimpo ilegal na região amazônica ficou ainda mais evidente após os assassinatos do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips, em junho de 2022. O ex-presidente da Funai, Marcelo Xavier, e o ex-coordenador de monitoramento territorial do órgão, Alcir Amaral Teixeira, foram indiciados pela Polícia Federal por má conduta nesse caso.