OLHARES

 

 

Por Eduardo Alves

 

 

Estourar bolhas e construir multiconvergência são dois dos grandes movimentos que atuam para unificar pensamentos, sentimentos e ações, principalmente no momento atual. Caminho que, no entanto, não pode ser talhado na burocracia ou na autoritária adaptação das diversas singularidades entre pessoas e organizações. O capitalismo é o ambiente que permite fácil desenvolvimento do individualismo e do patrimonialismo entre as pessoas e mesmo entre as organizações. Progressivamente o coletivo padece à ideologia do individualismo no qual a pessoa se torna, aos sentidos, a expressão máxima de instituições e das organizações. A ideologia assume o lugar principal de organização do poder, orienta os Estados, estabelece a guerra como prática comum e estabelece todos os links para explorações múltiplas globais. Nesse sentido, fazer o caminho oposto do que ideologicamente é predominante, desnaturalizando e aproximando ao verdadeiro COMUM – a natureza apropriada – é uma tarefa que demanda a mobilização dos corpos rumo ao coletivo.  A construção de caminhos que se convergem na multiplicidade, pela parcela mais numerosa da sociedade civil e grandiosa em potência de criação, de educação, de mobilização e de superação das opressões variadas, é um sopro de esperança. 

Tal identificação, por sua vez, não se dá apenas da sociedade civil para o mundo. O Banco Mundial investe na multiconvergência da minoria dominante que se apropriou do COMUM e que acimenta a exploração ainda com mais ênfase, fazendo com que a ideologia individualista se sobreponha com comuns fictícios. As empresas podem tudo e se dividem em cadeias de produção para ampliar a exploração e ampliar o comércio entre os países. 

Não é por menos que o relatório de 2009 do Banco Mundial se organiza partindo dos conceitos de densidade, distância e divisão, que são considerados fatores determinantes para que seja forjado o desenvolvimento regional. Nesse sentido, aponta os elementos da produção e do comércio no capitalismo como centrais e não a independência das regiões ou um desenvolvimento social sustentado pelas pessoas. As mercadorias e o lucro têm primazia sobre as pessoas e, como não poderia ser diferente no capitalismo, assumem o lugar de centralidade. Assim, são ignorados os múltiplos modelos de discriminação, de exploração e de controle que se movimentam entre os países e unifica o modelo global. O desenvolvimento social está em disputa, ainda que uma disputa muito desigual, pois facilmente coloca a exploração da força de trabalho como elemento central e desejante na cabeça da maioria, inclusive a explorada. Puxar a vara para outro lado e constituir outro vetor se faz fundamental. 

Para além disso, a sociedade civil se firma com organizações das várias classes, das múltiplas identidades, das diversas conexões com o presente. A sociedade civil é um espaço de disputa por ela própria, pelas diferenças e desigualdades que cabem na formação social capitalista. Outra formação social determinaria outra sociedade civil, mas isso está longe do foco central. E, assim mesmo, com as diferenças, cabe o duplo movimento: tanto para que a sociedade civil conquiste espaço na organização do poder, quanto para que as organizações da sociedade civil, que possuem sintonias e aproximações, ampliem suas multiconvergências em organização e ações comuns. Para tal, também é necessário superar obstáculos que dificultam a ampliação, o acolhimento, a convivência e o bom debate na diversidade e com as singularidades humanas no interior da sociedade civil, sob o risco de, em nome da ideologia organizativa, silenciar a multiplicidade de lugares e de falas.

Não há dúvidas, portanto, que movimentos que possam contribuir para estourar bolhas e aproximar identidades que são misturadas em suas singularidades no modelo de exploração que articula todas as formas de organização do poder, é uma gira fundamental para se avançar rumo ao BEM VIVER. 

Nesse sentido, o grande encontro realizado no dia 27 de março de 2021, em escala internacional, apresentou uma grande contribuição para avançar rumo ao que se apresenta como inatingível. O compromisso com o verdadeiro e com o BEM VIVER, articula a dignidade humana em sua máxima esfera. Movimentos como esse, que unificam etnias, cores, gêneros, sexos, territórios e linguagens em torno do elemento central da vida: viver com dignidade humana em todas as dimensões. 

Nesse sentido se faz importante e nos dá energia saudar o encontro MULTICONVERGÊNCIAS DE REDES GLOBAIS para a construção de um Parlamento Planetário. Um movimento que chega com força nos modelos de poder, mas se constrói e busca sua terra na sociedade civil com todas as suas diversidades e variações. Na construção da coerência entre pensamentos, sentimentos e ações há caminhos que se convergem na multiplicidade. Essa foi a marca desse grande encontro, que reuniu aproximadamente 80 pessoas, participantes de 13 redes globais, que fazem existir a multiconvergência. Em escala internacional o diálogo central foi a construção do PARLAMENTO PLANETÁRIO, com a sociedade civil em centralidade no processo de organização para viver fazendo existir o BEM VIVER.