Por Aram Aharonian

A América Latina viu seus piores presságios se cumprirem há um ano: um brasileiro que chegou da Itália deu positivo para covid-19, em São Paulo, em 26 de fevereiro de 2020 e disparou alarmes na região, que possui sistemas de saúde – talvez – mais frágeis do que a Europa. Desde então, 21 milhões de latino-americanos foram infectados e quase 700.000 morreram.

Hoje, a convocação para o retorno às salas de aula parece ser um denominador comum de muitos dos governos da América Latina, que agendaram o mês de março para essa convocatória. A propaganda oficial, disfarçada de discurso de legitimação, com narrativas da Unesco e da Unicef, tenta esconder os enormes interesses comerciais que estão por trás dessa convocação.

Enquanto isso, o desastre econômico ameaça dificultar os avanços conseguidos e o futuro de uma região que perdeu os caminhos da integração e da unidade, tão necessárias em tempos de crises econômicas, sociais, de saúde e ambientais.

Mas não clame a vitória: dois sábios técnicos do Fundo Monetário Internacional (FMI) traçaram o possível cenário pós-pandemia para julho de 2022, em que os governos pensam que o pior já passou, após uma exaustiva campanha de vacinação e pacotes de reativação econômica bilionários: o mundo, de repente, inflama-se, há batalhas campais em centenas de cidades e edifícios em chamas são projetados em milhões de telas de televisão. Os governos caem em eleições tumultuadas. Apocalipse no próximo ano.

Philip Barrett e Sophia Chen, técnicos do FMI, em seu relatório As repercussões sociais das pandemias (janeiro de 2021), apontam que uma pandemia “revela as fraturas já existentes na sociedade: a falta de proteção social, a desconfiança nas instituições, a percepção de incompetência ou corrupção dos governos”.

Com base na análise de milhões de artigos publicados na imprensa desde 1985, em 130 países, o FMI desenvolveu um índice de agitação social que permite quantificar a probabilidade de uma explosão de protestos como consequência da pandemia. Os técnicos relacionam os casos de explosões sociais com 11 mil eventos diferentes ocorridos desde a década de 1980: desastres naturais, como enchentes, terremotos ou furacões, além de epidemias.

Os especialistas descobrem “uma relação positiva e significativa” entre desastres, epidemias e agitações sociais. Muitos de nós entenderam essa correlação por experiência, ou instintivamente, mas o que é interessante na análise do FMI é a relação cronológica que ela identifica entre epidemias e agitações sociais, onde há um efeito de retardo significativo de até dois anos que separam o momento crítico da epidemia do momento em que começam as rebeliões.

Continuamos sofrendo

Um total de 20.747.458 casos de covid-19 foi registrado na América Latina e no Caribe. O Brasil é o país mais afetado por essa pandemia na região, com cerca de 10,5 milhões de casos confirmados e 254 mil mortes. A Colômbia está em segundo lugar, com mais de 2,2 milhões de infectados e quase 60 mil mortes. México e Argentina registraram pouco mais de dois milhões de infecções, com 185 mil e 52 mil mortes, respectivamente.

A chegada das primeiras vacinas oferece esperança, mas o acesso desigual a mais lotes, o desafio logístico e a lentidão na distribuição, além da corrupção, convidam à cautela. Além disso, as novas variantes mostram que o vírus está longe de ser controlado na região que é o epicentro global da pandemia. “Quero enfatizar que, certamente, não estamos fora de perigo”, afirmou a diretora-geral da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), Carissa F. Etienne.

O impacto de uma pandemia de um ano se enfocou em mulheres, estudantes pobres, a classe média e, claro, pessoas com comorbidades e idosos. São eles os grandes perdedores na região. Impacto intensificado na América Central, que enfrentou a crise sanitária e o assalto dos furacões Eta e Iota, em outubro e novembro, com pessoas em abrigos, incapazes de se isolar. A Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) alertou que 2,7 milhões de empresas na América Latina serão fechadas e haverá a perda de, aproximadamente, nove milhões de empregos.

A educação

Voltando à educação e à pandemia, as condições materiais de vida da população de alunos e professores foram e continuam a ser seriamente afetadas pela covid-19. Muitas famílias sofreram seus efeitos devastadores e, agora, os governos, sem vacinar professores e alunos previamente, estão buscando a reabertura geral ou parcial das escolas, o que viola o direito humano à vida.

A precariedade das condições de biossegurança e o apoio institucional limitado ou inexistente para garantir os protocolos que ela acarreta podem levar a uma tragédia que afetará, fundamentalmente, os trabalhadores da educação e, sobretudo, os filhos de famílias com menos recursos, aponta Outras vozes na educação.

Em toda a América Latina e no Caribe, os salários dos professores se deterioraram, enquanto, aproveitando a precária capacidade de mobilização dos professores, importantes conquistas sociais estão sendo atacadas.

*Periodista y comunicólogo uruguayo. Magíster en Integración. Fundador de Telesur. Preside la Fundación para la Integración Latinoamericana (FILA) y dirige el Centro Latinoamericano de Análisis Estratégico (CLAE, www.estrategia.la) y susrysurtv.

 


 

Traduzido do espanhol por Mércia Santos / Revisado por Graça Pinheiro

O artigo original pode ser visto aquí