CRÔNICA

 

 

Por C. Alfredo Soares

 

 

Todo dia quando acordo sigo uma espécie de ritual. Vou ao banheiro, escovo os dentes, volto para o quarto, arrumo a cama e, em seguida, preparo o meu café da forma tradicional, passando no coador. Depois me dirijo para o lado de fora da casa para regar as plantas do meu quintal. Meus cachorros me seguem e ficam me rodeando sem latir. Aproveito pra contar pra elas, as plantas, como foi minha noite, meus sonhos e o que terei de enfrentar ao longo do dia. Aprendi isso com a minha mãe. Confesso que a princípio achava estranho, mas hoje vejo o efeito benéfico desse costume. Sempre pergunto como elas estão, verifico se a terra está ressecada, rego e lhes desejo bom dia. Só que nesta noite choveu. Quando cheguei ao quintal elas já estavam despertas e viradas para o sol. Vi que tiveram uma noite de sonho, com a chuva fria da noite anterior. Percebi que talvez fosse melhor não desviar sua atenção. As plantas tem seus costumes.  Fiquei observando em silêncio como alguém que visita uma galeria de arte. Olhando nuances, que normalmente não observo. Vi que assim também interajo com as plantas do meu quintal. Elas gostam de ser admiradas. Aqui tem mais que flores; tem hortaliças (poucas), tempero, leguminosas, folhagem e um imenso pé de goiaba a produzir sombra aconchegante para quase todo o quintal. Os passarinhos visitam o espaço pela manhã e no final do dia. Fazem uma cantoria danada no alto da goiabeira. Ajudam a alegrar o ambiente. Tem um bem-te-vi que parece mais um despertador de tão alto que pia. Fiz uma banca de cheiro, com especiarias. Sempre  passo a mão sobre elas pra me perfumar de alecrim, manjericão, arruda, hortelã, alfavaca, orégano, arnica,  curry, salsa e cebolinha. Só sei que é muito bom e me faz bem.  Hoje as flores e plantas do meu quintal não precisam de mim. Mas elas sabem o quanto eu preciso delas. Sempre buscamos na horta um toque especial para o tempero do almoço ou uma flor pra ornamentar a mesa. Confesso que mexer com a terra é o tipo de terapia que me agrada. Não é algo simples. Cada planta tem seu manejo. Mas depois que se acostuma, não dá pra ficar sem ela. O legal disso tudo é que já posso ofertar aos amigos algumas mudas. Assim faço com que o hábito vá se expandindo dentro de mim, resgatando um jardineiro esquecido na minha juventude. Eu mesmo!