Surgiram várias vozes críticas ao muito bom projeto de lei apresentado no Chile para que, como em vários países europeus que sofreram com políticas de extermínio de grupos de pessoas, seja considerado delito negar a existência de crimes contra a humanidade cometidos sob a ditadura de Pinochet.

Foi dito de forma eficaz, mas sem fundamento sólido, que uma legislação deste tipo violaria o direito à liberdade de expressão. Aparentemente, não percebem que, por meio do exercício abusivo da liberdade de expressão, os direitos fundamentais de outras pessoas, particularmente o direito à honra, podem ser afetados. Por isso o fundamento da tipificação dos delitos de injúria e de calúnia em todas as legislações do mundo. Com certeza prejudica gravemente a honra dos familiares das pessoas presas, desaparecidas e executadas; dos seus advogados, e dos militantes das ONG de direitos humanos que há anos lutam nas denúncias e nos julgamentos contra os autores desses crimes atrozes, afirmar publicamente que tudo isso foi falso. Além disso, que foi complementado muito frequentemente, quase sempre em segredo, que, com a atribuição de que os familiares e seus advogados, procuraram fazer-se um “negócio” com isso fundamentalmente.

Por outro lado, essas difamações afetam a fé pública em documentos de alta importância, como o Relatório da Comissão da Verdade do Chile (Relatório Rettig); e o próprio trabalho subsequente dos tribunais de justiça que julgaram e condenaram vários dos piores criminosos contra a humanidade daquela época. Ainda mais, impossibilita qualquer base ética futura consensual a respeito dos direitos humanos fundamentais.

Além disso, com essas tipificações, a possibilidade de ter uma opinião política favorável sobre a ditadura não é afetada. É quase inacreditável a confusão gerada a respeito. Se até a liderança da Concertación de Partidos por la Democracia (coalizão, em sua maior parte de centro-esquerda, que tem governado em quase toda a pós-ditadura; e que experimentou uma mudança considerável para a direita desde o final dos anos 80) teve um juízo positivo a respeito do modelo econômico-social herdado pela ditadura! ; legitimá-lo, consolidá-lo e aperfeiçoá-lo em seus 20 anos de governo. Inclusive, líderes daquele conglomerado se expressaram muito positivamente sobre a obra econômica, social e cultural da ditadura e do próprio Pinochet. Assim, por exemplo, o ministro das Finanças de Patrício Aylwin (1990-1994) e depois senador e presidente do Partido Democrata-Cristão (PDC), e mais tarde chanceler de Michelle Bachelet (2006-2009), Alejandro Foxley, salientou que “Pinochet (…) realizou uma transformação, sobretudo na economia chilena, a mais importante que houve neste século. Teve o mérito de antecipar-se ao processo de globalização que ocorreu uma década depois (…) Há que reconhecer sua capacidade visionária (…) de que era preciso abrir a economia ao mundo, descentralizar, desregulamentar, etc. Essa é uma contribuição histórica que vai perdurar por muitas décadas no Chile (…) Além disso, passou no teste do que significa fazer história, pois acabou mudando o modo de vida de todos os chilenos, para bem, não para mal. Isso é o que eu acredito e isso coloca Pinochet na história do Chile em um lugar de destaque” (Coisas; 5-5-2000).

Por sua vez, o proeminente intelectual do Partido Pela Democracia (PPD), Eugenio Tironi, afirmou que “a sociedade de indivíduos, onde as pessoas entendem que o interesse coletivo não é mais que a resultante da maximização dos interesses individuais, isso já tomou forma nas condutas cotidianas dos chilenos de todas as classes sociais e de todas as ideologias. Nada disso, a curto prazo, irá reverter nenhum governo, líder ou partido (…) As transformações que aconteceram na sociedade chilena dos anos 90 não poderiam ser explicadas sem as reformas de caráter liberal dos anos 70 e 80 (…) O Chile aprendeu há poucas décadas que não podia continuar tentando imitar um modelo econômico que o deixava à margem das tendências mundiais. A mudança foi dolorosa, mas era inevitável. Quem o projetou e empreendeu mostrou visão e liderança” (La irrupción de las masas y el malestar de las elites. Chile en el cambio de siglo; Grijalbo, 1999. p. 36, 62 e 162).

Além disso, alguns disseram que só faz sentido tipificar e condenar incitamentos ao ódio, mas não negar a existência de realidades evidentes. Claro que, por exemplo, negar publicamente que a terra é redonda, ou que os dinossauros foram extintos, ou que Carlos Ibáñez foi presidente do Chile entre 1952 e 1958; não poderia ser tipificado e sancionado… Não prejudica a honra de ninguém; só a credibilidade de quem faz afirmações tão disparatadas. Muito diferente é negar a existência do método atroz da DINA-CNI (polícia secreta de Pinochet) de fazer desaparecer pessoas para sempre. Neste caso, a negação do ato criminoso constituiu um dos maiores agravantes dessas atrocidades. Procurou-se acrescentar; para toda a sua vida!; aos familiares o calvário de nem sequer saber com certeza se seus familiares morreram e como, onde estão seus restos para, pelo menos, poder honrá-los. Na verdade, deve ser muito difícil produzir crimes mais odiosos que o desaparecimento forçado de pessoas.

Por isso, continuar a negar até hoje essa realidade, em que aquilo foi plenamente confirmado pelo Estado chileno, significa endossar o ódio pretendido por aqueles que conceberam tais crimes, e continuar a contribuir para a eficácia daqueles e para os danos causados aos familiares. Naturalmente, não tem o mínimo impacto na possibilidade de exercer o direito de continuar a expressar opiniões positivas sobre o legado econômico-social da ditadura, como fizeram-no até hoje líderes famosos da direita e do “centro-esquerda” chilenos.

Por tudo isso, constitui um projeto de lei muito positivo a criminalização, tal como em vários países europeus, do negacionismo dos crimes contra a humanidade cometidos pela ditadura de Pinochet. Esperemos, para o bem do Chile e do mundo, que finalmente seja aprovada no Congresso e se torne uma lei.


Traduzido do espanhol por Paola Bastos Curcio