Encontro ocorre paralelamente à reunião dos chefes de Estado, no Panamá

Por Rafael Tatemoto, enviado especial ao Panamá, do Brasil de Fato

Uma marcha organizada por movimentos populares de toda América Latina realizada na tarde desta quinta-feira (9) marcou o início da Cúpula dos Povos no Panamá, evento que ocorrerá de forma paralela à Cúpula das Américas, onde se encontrarão os presidentes do continente.

A manifestação se concentrou próxima à embaixada de Cuba no país e seguiu até a Universidade do Panamá, local onde o evento ocorre. A tônica da caminhada foi de solidariedade ao governo e ao povo venezuelanos. Muitos presentes vestiam camisetas nas quais se podia ler “Venezuela não é uma ameaça, é a esperança” ou “Obama, revogue o decreto já!”.

As mensagens faziam referência ao decreto do governo estadunidense que considera a Venezuela uma ameaça à segurança dos EUA e estabelece propostas de sanções econômicas.

Muitos panamenhos presentes na manifestação também lembravam das ingerências estadunideneses sobre seu país. “A Venezuela é o país que está indicando o rumo para a integração latino-americana, e por isso é hoje ataca pelo império”, disse o panamenho Marcelino Ruiz, de 65 anos. “Nós também fomos atacados por eles, massacraram o povo, muitas pessoas morreram e a até hoje não houve justiça”, afirmou Ruiz, em referência à invasão de 1989. “Com a desculpa de capturar uma pessoa, vários bairros foram destruídos”, acrescentou. À época, tanto a Organização das Nações Unidas (ONU) como a Organização dos Estados Americanos (OEA) condenaram a operação dos EUA.

O tom de denúncia se combinava à esperança dos venezuelanos presentes na caminhada, como Dennys Guedez. “O povo venezuelano e latinoamericano estão unidos contra esse decreto absurdo e infame. Maduro foi legitimamente eleito”, afirmou. Para ele há chances dos EUA mudarem sua posição durante o encontro no Panamá. “Os povos estão aqui, está tudo à mostra, a opinião pública mundial está pressionando Obama para que as relações com a região melhorem”, concluiu Guedez.

Debates

Os integrantes da mesa de abertura da Cúpula dos Povos mantiveram o tom de crítica aos EUA. Fernando Cebamanos, presidente da Frente Ampla Democrática (FAD), partido de esquerda no Panamá, destacou aquilo que considera a ofensiva dos EUA sobre a América Latina, “em especial nos casos de Cuba e Venezuela”, lembrando um episódio na qual a história dos três países se entrelaçou. Trata-se da tentativa, em 2000, de assassinato de Fidel Castro pelo agente da CIA Luis Posada Carriles, cujo plano era explodir exatamente o mesmo auditório da Universidade do Panamá onde a Cúpula dos Povos estava sendo inaugurada. Carriles é conhecido por ter derrubado um avião comercial cubano em 1976 e por ter realizado uma série de atentados terroristas com bombas em pontos turísticos da ilha.

Elberto Cobos, presidente da Central Nacional dos Trabalhadores do Panamá e vice-presidente da Federação Sindical Mundial, celebrou a presença dos ativistas latino-americanos, cujo número, segundo a organização, ultrapassou 3.000 pessoas. “Essa é a verdadeira Cúpula, sem listas secretas, sem patrocínios de do Pentágono e de multinacionais. Aqui estão os povos, de forma voluntária”, disse o sindicalista. Cobos terminou sua fala de forma enfática, se dirigindo aos dissidentes cubanos e venezuelanos: “O Panamá não é Miami!”.

Fórum da Sociedade Civil

O discurso do panamenho fazia referência às tensões ocorridas durante o Fórum da Sociedade Civil, evento oficial prévio à Cúpula dos Povos. Desde a quarta-feira (8), os cubanos vinham denunciando a presença de opositores do regime socialista nos espaços destinados às discussões dos representantes da sociedade civil dos diversos países. A participação de elementos ligados a ações terroristas na América Latina promovidas pela CIA passou a ser criticado por pessoas de outros países.

Na manhã da quinta-feira (9), dois grupos de trabalho foram inviabilizados por conta da questão. No grupo temático de discussões sobre “governabilidade”, a delegação oficial dos representantes da sociedade civil de Cuba reclamava que parte de seus integrantes não havia conseguido se credenciar, ao contrário dos que ocorrera com os dissidentes. A situação chegou a um limite quando o mesmo Carriles citado por Cebamanos adentrou a sala para tentar acompanhar a reunião.

Os cubanos exigiram a saída de Carriles antes que as discussões começassem. Como os membros da OEA não atenderam ao pedido, os trabalhos não prosseguiram e, com a confusão, o debate do grupo sobre “participação cidadã” também foi interrompido. Ao final, com estadunidenses e os dissidentes se retirando, os cubanos e as delegações que permaneceram prosseguiram as discussões de maneira informal.

O Fórum da Sociedade Civil termina na sexta-feira (10) e a Cúpula dos Povos no sábado (11). A Cúpula das Américas, no domingo (12).